FALAR É FÁCIL, TER A EXPERIÊNCIA NÃO
Decerto alguns teóricos da solidão nunca a vivenciaram, desconhecem o profundo vazio desse poço angustiante cavado no deserto da vida. Refiro-me à solidão do abandono, da indiferença e do desengano, dos que são esquecidos e deixados para trás, para a imensidão do nada. Não, certamente esses teóricos não sabem o que é não ter um ombro amigo ou amoroso onde pousar a cabeça e chorar, estar longe de tudo e de todos estando tão perto e ser invisível, buscar com os olhos um mero sorriso capaz de despertar o desejo de seguir em frente, entrar numa loja qualquer da cidade tendo por único objetivo falar com os vendedores mesmo que não vá comprar nada, simplesmente no intuito de desafogar-se do turbilhão de palavras amontoadas no peito e ouvir outras vozes humanas que demonstrem sua própria existência e aliviem a angustiante sensação de estar morto apesar das descompassadas batidas do coração negarem isso. Não ousem definir a solidao os que jamais a viveram, os que em tempo algum viram os olhares tristes, perdidos e introspetivos dos idosos deixados em asilos pelos filhos como se descartados, à guisa de roupas velhas imprestáveis. Algum dos idealizadores da solidão já ouviram o desabafo do idoso ou idosa que mora sozinha e não recebe a visita de ninguém da família, bem de amigos ou vizinhos, e vive em meio às multidões dos supermercados, das ruas e até mesmo dos condomínios onde reside e não é visto, não ganha cumprimentos nem lhe é dirigido um mero olhar de simpatia ou de compaixão? A solidão é dor que somente a alma silenciosa do solitário sofre, agonia interminável em todos os momentos do dia e da noite, e termina no último suspiro. Todavia, a solidão pode terminar antes do fim, bastam sorrisos, abraços, atenção e o conforto da presença ainda que de vez em quando. Sem dúvida, há quem goste da solidão, mas são tão poucos, um número ínfimo de pessoas que preferem a distância de seus semelhantes, sabe Deus por quê. A infinita maioria humana, no entanto, usufrui de seus iguais e sente falta de suas presenças se são deixadas sós, ao abandono, à indiferença. Morrer sozinho provavelmente deve ser o pior dos castigos impostos aos que amam a convivência humana. E para os que teorizam sobre as benesses de ser solitário sem nunca ter sido, mas anelam companhia ao correr dos seus anos, passem um mês isolados e sozinhos nalgum lugar ermo e depois voltem a falar a respeito. Ah, mas não podem levar consigo bichinhos de estimação, pois se na vida de uns tantos eles substituem humanos, na da maioria não.