Não apenas um jantar!

Eu já passei da idade de me surpreender com as pessoas, mas aquele homem me intrigava. O que ele fazia, ou melhor, o que se dizia que ele estava realizando na Galileia e também na Judeia me deixavam intrigada.

Pensei comigo mesma: "Minha vida tem sido uma sucessão de erros e eu me sinto pressionada na minha consciência com acusações que me escravizam, além de me sentir acusada e condenada pelas pessoas que desconhecem as razões do meu comportamento. Se é verdade que esse galileu tem poder para fazer tantos sinais, então ele também tem o poder de me curar dos fantasmas que me perseguem e que me acusam impiedosamente."

Decidi procurá-lo quando soube que ele fora convidado por Simão para um jantar em sua residência. No entanto, eu tinha plena consciência de que poderia não ser bem recebida por causa da religiosidade preconceituosa praticada por Simão que era homem culto e extremamente zeloso da tradição dos mestres da minha nação.

Confesso que ao pensar dessa forma, quase fui desestimulada de procurar o Mestre, pois as barreiras do preconceito atuavam  contra a minha disposição de tentar acertar o caminho a seguir.

E não é assim que acontece com todos? Quantas vezes nossos esforços pessoais de nos libertarmos dos laços que nos aprisionam à corrupção, à licenciosidade, à prostituição, à prática da maldade intencional e outros, são frustrados por não encontrarmos apoio, compreensão, misericórdia e compaixão daqueles que se julgam blindados e imunes às questões que afetam o comportamento da humanidade aos olhos do Criador?

Eu não sabia disso, mas se eu não agisse intencionalmente buscando ajuda de quem aparentemente reunia reais condições de me ajudar, eu jamais poderia me libertar da vida leviana que praticava todos os dias vendendo o meu próprio corpo para poder sobreviver às dificuldades impostas a mim pela sociedade esmagadoramente egoista e preconceituosa, embora muito religiosa.

De repente, enquanto caminhava e pensava em tudo isso, nem mesmo me dei conta de ter chegado ao meu destino. O sol já estava se pondo no horizonte indicando que o jantar já estaria sendo servido, segundo os costumes do nosso povo... E lá estava eu, diante da porta de entrada da casa de Simão tendo em minhas mãos o perfume que eu estava disposta a derramar sobre o famoso galileu.

Disfarçadamente dei uma olhada no interior da casa e vi, sentado à mesa, à minha direita e com outros convidados, aquele a quem meu coração buscava. Confesso que quase desisti da minha intenção quando identifiquei o dono da casa assentado à sua frente tendo ao seu redor os criados que serviam aqueles pratos aparentemente deliciosos.

A minha decisão de mudar de vida foi mais forte que a vergonha e o preconceito. Eu poderia até ser ridicularizada, pois a minha vida pregressa não era de todo desconhecida e ali, bem na minha frente, eu podia até identificar alguns que satisfizeram os seus desejos com a exploração sexual da minha própria nudez. Por esta razão, fui empurrada pela minha própria consciência para o interior da sala e iniciei o meu plano de demonstrar, pelo meu gesto e atitudes não apenas o arrependimento de ter vivido tanto tempo na imoralidade lasciva, mas com lágrimas que demonstravam o meu quebrantamento ali estava eu, silenciosamente gritando e clamando pelo perdão daquele que se dizia filho de Deus.

Não sei dizer quanto tempo durou aquele momento, mas, de repente eu comecei a prestar atenção ao diálogo que o Mestre iniciou com Simão e percebi que eles estavam falando sobre mim.

Simão foi rápido para responder à alegoria proposta por Jesus sobre a pessoa que devia quinhentas moedas ao credor e a pessoa que lhe devia apenas cinquenta moedas. Nenhum dos dois tinha como pagar a dívida, pelo que o credor perdoou-lhes a dívida. E o Mestre acrescentou: "Qual dos dois devedores amará mais o credor?"

Simão respondeu, sem titubear, que seria aquele que recebeu o perdão da dívida maior, ao que Jesus, então, passou a ser mais objetivo com ele praticamente destruindo toda a sua religiosidade estéril apontando para mim e fazendo as seguintes comparações:

"Simão, quando entrei em sua casa, você não lavou os meus pés conforme o nosso costume, não me saudou com o beijo tradicional de boas-vindas e nem me ungiu a cabeça com óleo para aliviar o calor da caminhada até aqui. Contudo, essa mulher cujo comportamento social você conhece e reprova, desde que entrei não cessa de molhar os meus pés com as próprias lágrimas de um coração arrependido, beijando-os seguidamente e ungindo-os com este perfume puríssimo para aliviar o meu cansaço.

Percebe agora, Simão, que a verdadeira religião é a prática do bem no reconhecimento do amor e do perdão? E você consegue compreender que aquilo que ela está fazendo numa demonstração de muito amor é o reconhecimento do perdão dos seus muitos pecados?

Devo agradecer a você o convite para este jantar, no entanto é importante aprender a lição: Aquele a quem muito se perdoa, este demonstra muito amor. Mas aquele que julga não ter muito o que se perdoar, por conseguinte também demonstra pouco amor!"

Estava me levantando para sair, quando o Mestre se dirigiu a mim para me dizer: "Seus pecados estãos perdoados. A tua fé te salvou. Vai em paz!" Levantei-me e saí, não sem antes me despedir do Mestre que curara a minha alma e restaurara a minha condição moral. Sentia-me aliviada, sem qualquer peso na consciência.

Já era noite e o meu lugar não era e nunca mais seria as ruas da cidade. Nunca mais eu viveria a mesma vida satisfazendo os desejos e a sensualidade dos antigos clientes. A lascívia e a imoralidade já não me prenderiam mais ao passado, pois Jesus me libertara de mim mesma.

Como não agradecer? Como não amar Aquele que me livrara da escravidão moral e espiritual?

Essa é a minha história!

Assim foi o meu encontro com Jesus, e eu pergunto: Como será com você quando Jesus de Nazaré te encontrar?

Deus te abençoe.

Pr. Oniel Prado

Outono de 2021

13/06/2021

Brasília, DF