LEMBRANÇAS APAGADAS
A cada visita, percebo que a lembrança se escasseia. As perguntas constantes: você mora onde? é perto daqui? você é casada? tem filhos? - Respondo com todo carinho, cada pergunta. E ao final, ela* diz não lembrar de mim, não me reconhecer. Com menos de um minuto, tudo se repete. Dói ver seu banco de memória totalmente apagado, como se não tivesse nada vivido até aqui. Seu riso frouxo, seu olhar indefinido, sem reconhecer a quem tanto estimou, a quem se doou em amor.
Não restou sequer uma fagulha de lembrança, que possa acender uma vela para clarear o caminho de volta, a dois anos atrás.
Nessa visita semanal, dispenso a ela alguns cuidados pessoais; faço seu lanche preferido; faço-lhe carinho, converso, sorrio com suas perguntas tão repetitivas, e, tento fazê-la lembrar alguns episódios que vivemos, mas é impossível levá-la de encontro a sua memória, que se diluiu no espaço de tempo de seus 94 anos.
No entanto, a gentileza e o amor permanecem em seu ser. E com um sorriso, meio desconfiado, diz: “muito obrigada por fazer isso por mim. Não tenho como retribuir...você é tão boa para mim...Deus te abençoe!”
Então, digo-lhe: minha querida, a senhora já fez tanto por mim, que isso nada significa diante do muito que me foi dado.
Ela retruca: eu? Não lembro disso; se fiz alguma coisa por você...
Respondo-lhe: Fez sim. “Embora não saiba quem eu sou, sei quem a senhora é”. Jamais esquecerei o anjo, que me emprestou asas por muitas vezes, nessa jornada terrena. A proteção e o bem querer que sempre me destinou. Ela ri, incrédula. E nesse momento, reina uma paz indefinida, um olhar de ternura, o amor que transborda daquela alma iluminada, que me toca profundamente. Como sou grata por tudo isso. Por reconhecer o amor em mão dupla, da forma mais singela e especial.
Não consigo olhá-la, sem deixar uma lágrima cair, provocada pelas boas lembranças, que habitarão meu ser para sempre.
*Homenagem a minha amada e dulcíssima - tia/madrinha Júlia (94 anos)
10/jun/21
Não restou sequer uma fagulha de lembrança, que possa acender uma vela para clarear o caminho de volta, a dois anos atrás.
Nessa visita semanal, dispenso a ela alguns cuidados pessoais; faço seu lanche preferido; faço-lhe carinho, converso, sorrio com suas perguntas tão repetitivas, e, tento fazê-la lembrar alguns episódios que vivemos, mas é impossível levá-la de encontro a sua memória, que se diluiu no espaço de tempo de seus 94 anos.
No entanto, a gentileza e o amor permanecem em seu ser. E com um sorriso, meio desconfiado, diz: “muito obrigada por fazer isso por mim. Não tenho como retribuir...você é tão boa para mim...Deus te abençoe!”
Então, digo-lhe: minha querida, a senhora já fez tanto por mim, que isso nada significa diante do muito que me foi dado.
Ela retruca: eu? Não lembro disso; se fiz alguma coisa por você...
Respondo-lhe: Fez sim. “Embora não saiba quem eu sou, sei quem a senhora é”. Jamais esquecerei o anjo, que me emprestou asas por muitas vezes, nessa jornada terrena. A proteção e o bem querer que sempre me destinou. Ela ri, incrédula. E nesse momento, reina uma paz indefinida, um olhar de ternura, o amor que transborda daquela alma iluminada, que me toca profundamente. Como sou grata por tudo isso. Por reconhecer o amor em mão dupla, da forma mais singela e especial.
Não consigo olhá-la, sem deixar uma lágrima cair, provocada pelas boas lembranças, que habitarão meu ser para sempre.
*Homenagem a minha amada e dulcíssima - tia/madrinha Júlia (94 anos)
10/jun/21