Memória seletiva!
Tâmaras!
Adoro tâmaras. São deliciosas, doces, macias, muito saudáveis e sempre abundantes em nossa região, trazidas há centenas de anos do antigo Egito desde que o profeta Moisés conduziu o nosso povo para a liberdade.
Minha memória é seletiva quanto à apreciação deste fruto proveniente da tamareira ou, tamargueira, considerada a "rainha do deserto". Desde muito pequena eu aprendi a apreciar a tamareira, sempre verde e soberana produzindo frutos em pleno deserto. Brincávamos, minhas coleguinhas e eu rodeando-as e correndo entre elas com muito cuidado por causa do seu tronco espinhoso, mas, sempre generosa com a sombra das suas folhas largas, como toda palmeira, proporcionando abrigo contra o sol inclemente.
Meu pai sempre dizia que as tâmaras que tínhamos em casa provinham de tamareiras plantadas há muitos anos, por isso se dizia que "quem planta tamareiras, jamais come das suas tâmaras", isto porque elas demoram dezenas de anos para produzir os seus frutos.
Eu mal havia completado doze anos de idade quando este meu mundo desmoronou. Adoeci gravemente e já não mais podia brincar com minhas amiguinhas. Via estampada na face dos meus pais a angústia, a preocupação e o desespero. Lembro-me, e muito bem daquele dia quando vi o meu pai chorando, tendo o rosto transtornado e consumido pela tristeza e dor depois de ouvir a palavra do médico que me assistiu até o meu último suspiro.
Daqueles dias, a minha última lembrança foi a do meu pai saindo de casa, correndo e gritando desesperadamente dizendo que estava indo buscar ajuda de um galileu que estava passando por nossa cidade. A partir daí, não me lembro de mais nada, pelo menos no período de tempo em que estive completamente inconsciente.
Algum tempo passou e por muitas vezes os meus pais me relataram como foram difíceis aqueles dias que antecederam a minha enfermidade e como foi importante para a nossa família conhecer aquele Rabi que me trouxe de volta à vida.
O meu pai sempre foi muito responsável e dedicado aos seus afazeres na qualidade de administrador da sinagoga. Na verdade, ele era bem mais que um simples administrador local. A sua função administrativa alcançava outras sinagogas em nossa região conhecida como Decápolis, pois reunia pelo menos dez cidades próximas e intercambiáveis no que dizia respeito ao comércio, cultura, artes e religião. Ele fora escolhido como chefe principal da sinagoga e todos lhe devotavam muito respeito e admiração pelo seu trabalho.
Quantas vezes eu ouvi o meu pai contar a minha história com lágrimas abundantes nos olhos. Como foi difícil para ele, homem respeitado que era entre os judeus, recorrer a Jesus de quem se dizia, à época, capaz de curar toda espécie de enfermidade. Naquele dia específico, conta ele que se aproximou de Jesus e no auge do seu desespero lhe implorou que fosse até a nossa casa porque eu estava muito doente.
O Mestre se interessou por nós e decidiu vir à nossa casa, mas a multidão impedia que Jesus se apressasse. Houve um momento em que o meu pai se desesperou, pois uma senhora saindo da multidão chegou bem perto de Jesus e tocou nas suas vestes. Isto fez com que o galileu parasse para atender a mulher que confessou ter sido curada por ele ao simples toque.Todos ficaram maravilhados, mas o meu pai quase teve uma crise diante do atraso de Jesus na sua caminhada até a nossa casa.
A situação ficou ainda mais tensa quando algumas pessoas, vindas da nossa casa, disseram para o meu pai não mais incomodar o Mestre porque eu havia falecido. Atento a tudo, Jesus virou-se para o meu pai e lhe disse: "Não temas, continue crendo!" E, retomando a caminhada, chegou em casa onde já se encontravam vários amigos do meu pai e muitas outras pessoas, inclusive flautistas e carpideiras encarregados do serviço fúnebre e do meu sepultamento.
Havia muita tristeza no ar. Muitos choravam a minha morte, mas Jesus foi incisivo. Disse que eu não estava morta, apenas desfalecida, no que foi ridicularizado. Conforme meu pai me contou muitas vezes, ele pediu que todos saíssem e, na companhia de três dos seus discípulos, do meu pai e da minha mãe subiu até onde eu me encontrava, tomou-me pela mão e disse: "Talita cumi" que significa, carinhosamente, "Garotinha, levante-se!"
A partir daí a minha vida mudou completamente.
Mudou porque voltei da morte para a vida!
Mudou porque isso jamais acontecera em nossa região!
Mudou porque meu pai reconheceu que nem toda a religiosidade formal que ele tão apaixonadamente defendia tinha sido capaz de me devolver a vida.
Mudou a minha vida porque passei a ser conhecida simplesmente como a filha de Jairo, a menina que experimentou a morte, conheceu o silêncio sepulcral da ausência de vida, mas foi resgatada das sombras por aquele que se tornara conhecido como Jesus, o Messias de Israel e Salvador do mundo.
Você pode imaginar a felicidade que a nossa família voltou a experimentar?
Você pode imaginar as transformações que o meu pai sofreu ao rever todos os seus conceitos de religiosidade?
Andando pelas ruas da nossa pequena cidade, ninguém mais me chamava pelo nome. Diziam somente: "Olhem, lá está a filha de Jairo."
Muita coisa mudou em nossa casa. O meu pai serviu como administrador da sinagoga ainda por vários anos. No entanto, o seu propósito de servir agora era diferente. Antes, ser administrador era apenas uma função política e social, mas a partir do encontro com Jesus o exercício da função transformou-se em um ministério. E, com isso, o respeito e a atenção das pessoas pela nossa família tornou-se ainda maior e mais presente.
Muitos anos já se passaram. Meu pai serviu como administrador da sinagoga até o dia em que partiu para se encontrar com o Messias, na eternidade. Vivo hoje das reminiscências, e elas me ajudam a jamais esquecer de um pequeno detalhe que subsistirá ao tempo.
Ao recobrar a consciência depois que Jesus me devolveu à vida, o Mestre orientou os meus pais a que me oferecessem algo para comer. Quase que imediatamente a minha mãe surgiu na sala com um prato e, dentro dele, como a minha primeira refeição da nova vida, o "matzá" que é o nosso pão sem fermento, uma porção de geléia com sabor característico e uma porção de compota de...Tâmaras!
Foi por isso que iniciei essa minha história afirmando que a minha memória é bastante seletiva. Jesus é responsável por isso. O que ele fez por mim é impossível contar sem que lágrimas me venham aos olhos e sem que o sabor adocicado das tâmaras aflorem ao meu paladar.
Por esta razão, a "filha de Jairo" que hoje não é mais uma garotinha convida você também a ser um seguidor de Jesus pois o que ele fez por mim e por minha família, também quer fazer por você e sua família.
Pr. Oniel Prado
Outono de 2021
06/06/2021
Brasília, DF