Entre covas e vidas rasas
(Trinta dias após a visita do prefeito Silvio Mendes à Vila Maria Luiza, e da sua promessa de amparar as sessenta famílias do local com o projeto Vila Bairro - projeto de melhoria das condições de moradias dos menos afortunados da nossa capital; ou seja: engodo eleitoreiro pra época de eleição)
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O farrapo humano cruza com o terno engomado. Local onde o espírito arrependido senta-se ao pé do mundo, e nas sombras dos cantos de desespero uma bexiga estoura, molhando de álcool o chão batido de terra - terra sempre sedenta de sangue coalhado. E na tarde, o crepúsculo rotineiro vai pintando o retrato com visitas inesperadas dos senhores do poder às favelas das nossas cidades.
Mas, visita é visita! A barriga vazia na mesa quebrada - que não conhece o gosto do caviar, mas o exalta junto ao consolo televisivo - continuará no seu momento de sobras, enquanto a morte banqueteia-se com a semente-criança que não se tornará rosa: embrião que não verá a luz, mas conhecerá a velocidade do infinito na sua inocência de morte.
E nessa dualidade - poder e favela - a dicotomia do simples gera o luxo nas promessas fartas transparentes - promessas com matanças precoces de vidas sem transparências de dignidade... O mínimo dos necessitados dá a continuidade do conformismo e os marketeiros de plantão conhecem as regras do jogo quando o lixo é um luxo: ao pobre, tudo que se dá, vira bosta! O rico homem do poder somente aos pobres se igualará na borda de sete palmos em caixões diferentes - mas, por enquanto: "comei e bebei, o resto não importa!"
E nessa armadilha de promessas - onde apenas um cai -, não há um único santo para todas as dores, porque os homens não têm as mesmas opções, o mesmo pedido, a mesma canção, o mesmo refrão...
O espelho responderá sempre ao ego da beleza escusa outorgada; o punhal manchado mutila cortando a mão de quem o manuseia, enquanto o sangue jorra em resposta - O pedido do pedinte é o mal que o mantém refém dos poderes dos homens!
Senhores políticos em favelas com promessas vãs: "Vós sois como os salteadores da costa despojando os náufragos". Ao servil, que carrega pedra e pão, sem entender o suplício do viver desigual - e ainda guarda os despojos da vida sem razão -, ficará apenas a choupana com a promessa que seguirá o terno. A espera de uma acolhida de morte será a companheira daquela que não tardará vir, e nenhuma voz clamará na madrugada sedenta de justiça: "De pé, ó vítimas da fome!"
Os excluídos do simples ato de bem viver, jamais deverão, simplesmente, aceitar que a voz da contestação, da reivindicação... da luta pela dignidade humana se cale diante das promessas para consolo dos vivos sobre os corpos dos mortos: um dia poderemos concordar que: "Viver é adaptar-se." Por enquanto, não!
Esperemos, então!
Até mais ler pelas promessas políticas da vida!