TEXTO DESCOSTURADO

TEXTO DESCOSTURADO

Na medida em que o tempo passa acumulam-se saudades. Saudades estas que muitas vezes não sabemos sentir. São abraços, gestos, beijos que foram registrados numa velocidade que se desdobra aos poucos. O ato rompeu os ponteiros do relógio.

Um vazio pode ser um amor mal resolvido. Não apenas passional. Um amor pela infância, por um brinquedo, pela escola, por uma mãe, um pai. Então, para suprir esse vácuo no tempo, nós buscamos refúgio. Uma válvula de escape para filtrar o que na vida foi interditado. Cumprimos agendas. Trabalhamos loucamente. Viramos escritores, professores, acadêmicos, pintores, escultores, poetas, alcoólatras...

Todos esses ofícios parecem ter algo em comum: a luta para não cair no esquecimento. O combate contra o silêncio. A renovação. O sonho. Ferreira Gullar já dizia que “a arte existe porque a vida não é suficiente”. Para mim, a vida pode ser a própria arte. E por que não? Conhecemos pessoas que não escreveram um verso, mas são naturalmente poetas. Conseguem extrair a essência do dia a dia com o olhar.

Castelos, fadas, duendes e monstros existem. Sim, existem!

Os sustos da vida, os surtos da vida, a consciência da nossa finitude nos leva a buscar os significados ou a perdê-los. Não há meio termo. O que somos é sempre uma busca. Não somos, estamos sendo. Até o mais forte guerreiro tem o direito de chorar. Felicidade virou obrigação, que se tornou loucura.

O pranto deslocado. Quem bate mais forte – o coração ou o relógio? Antes éramos salvos pelo gongo, hoje somos massacrados. É preciso duvidar sempre de que algo flui facilmente. Será que para tudo é preciso encontrar um sentido? Não. Verdades inventadas.

No vasto caminho das possibilidades somos a torre de Babel de nós mesmos. Tantas vozes. Tantas linguagens, signos e sinais. Há amores e amores. A saudade é um adeus ao contrário. A luz que ilumina é a mesma que cega. É melhor ser ingênuo?

Não tenho mais medo do escuro. Temo a ex-cura. Está cada vez mais difícil escrever. Como se a escrita fosse um antibiótico que já não surtisse efeito diante da bactéria chamada tédio. Perdi o fio? Esse tecido de palavras está desalinhado? Pouco importa! Me deem apenas essa liberdade! Deixem-me usar meu polo norte, sul, leste e oeste para girar em 360 graus. Lucidez demais é loucura!

O amor é, ao lado da arte, a licença para superar as condições humanas. Amar deve ser a ferramenta de recomposição diante das mazelas da vida. O coração se transfigura reduzindo o egoísmo que tanto nos pesa. Ao mesmo tempo, quando se ama, acredita-se ser proprietário do objeto amado e ninguém quer perdê-lo. Não. Isso é paixão.

O amor é um egoísmo a dois. Não me lembro quem disse isso. Não importa. Adotei. Há amores e rumores.

Leo Barbosaa
Enviado por Leo Barbosaa em 27/05/2021
Código do texto: T7265310
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