AQUELA MATINÊ FOI INESQUECÍVEL
Início dos anos sessenta, o Brasil acabava de entrar em um regime militar de governo, tentava debelar a anarquia política que estava instalada no país por elementos comunistas, mas de certa forma vivíamos uma situação de tranqüilidade social, nossos direitos legais estavam preservados, eu tinha 15 para 16 anos, era um jovem sonhador, imaginava ter um emprego para levar uma namorada ao cinema ou ao parque, poder pagar um sorvete ou um refrigerante. Enquanto isso não acontecia eu ia levando a vida na maior naturalidade.
Sempre gostei de cinema, desde os tempos de criança, gostava de uma matinê no Cine Atlântico, no Pina, bairro da minha cidade onde vivi a adolescência. Nessa época os gibis estavam em evidência, eu tinha um bocado, trocava por outros na porta do cinema. Terminei desistindo disso, dava muito trabalho e não tinha tempo para olhar as meninas sonhadoras, logo eu um sonhador inverterado. Foi então que, certa tarde, notei que uma garota me olhava, fiquei me sentindo nas nuvens e impressionado com a sua beleza. Mesmo sendo um rapaz tímido procurei me aproximar disfarçadamente e consegui chegar perto dela. Um sorriso foi sua resposta quando a encarei criando coragem, outro sorriso de minha parte. Ela perguntou pelos gibis e eu respondi que não interessavam mais. Conversa vai, conversa vem, entramos para assistir a sessão, o ingresso já estava comprado, o dela também. Sentamos juntos e assistimos ao filme, um bang bang que nesse tempo era o que mais a garotada gostava, eu mesmo não perdia um domingo, a matinê era sagrada. Durante a exibição a única coisa que fiz foi tocar sua mão, imaginava sentir o sabor daqueles lábios que muito me encantaram.
Na saída tive o ímpeto de segurar sua mão, achei-a bem macia, senti minha pele do rosto ser acariciada com aquela maciez. Um amigo que também saía da sala de projeção perguntou se era minha namorada. Me assustei quando era própria respondeu afirmativamente, cheguei a corar, o coração bateu com tanta rapidez que talvez ela tenha percebido e perguntou o que eu sentia. Nada respondi, só sorri. De mãos dadas caminhamos alguns metros e entramos numa sorveteria, foi a primeira vez que paguei um sorvete para uma namorada, quer dizer, eu assim estava imaginando. Nos despedimos e marcamos para o próximo domingo, para a próxima matinê. Foi a primeira e última matinê da minha vida junto com essa garota, nunca mais a vi e nem sequer procurei saber o seu nome.