Carta sobre coisas que aprendi em um ano
 
A casa onde às vezes regresso é tão distante
da que deixei pela manhã
Tolentino de Mendonça

     Quanto tempo é preciso para chegar aonde se deseja? O que sei é que o caminho nunca é retilíneo. Igualmente, reconheço importante, de tempos em tempos, recolher num cesto as descobertas, os aprendizados, as lições, as vitórias e as derrotas e todo o resto, espalhados pelo caminho percorrido. Este um ano vivido aqui junto deste povo acaba por ser metáfora para toda uma vida.

     Aprendi que ou o sim é integral ou nunca será um sim. Ele exige fidelidade, entrega e alegria. E nem sempre é bom perguntar: por quê? Tenho descoberto que trabalho e descanso devem ser muito bem equilibrados, mas que desculpas não combina com nenhum deles. Aprendi, neste tempo, o valor de uma amizade que carrega consigo a marca das experiências, o que faz ecoar sabedoria nas conversas. Em mesma intensidade, sinto que os amigos coevos fazem um bem imenso à alma. Nos proporcionam sentir a alegria e a beleza do nosso próprio tempo – na linguagem, na reciprocidade, nas pizzas...

     Ouvir os mais velhos que nós é de uma riqueza sem par. E como tenho aprendido lições com esse exercício. Para tanto, é necessária uma saudável e caridosa paciência – também isso me ensinaram os nonos daqui. Dia após dia, reaprendo que julgamentos sempre serão precipitados, mais ainda quando não conheço a história de quem julgo. Tem razão Clarice Lispector: Antes de julgar a minha vida ou o meu caráter, calce os meus sapatos e percorra os caminhos que percorri, viva as minhas tristezas, as minhas dúvidas e as minhas alegrias. Percorra os anos que eu percorri, tropece onde eu tropecei e levante-se, assim como eu fiz. Aprendi que ouvir e calar, ouvir e falar, devem ser sempre antecedidas pelo ouvir e acolher.

     Aprendi que aplausos são bons, são muito bons. Que os elogios devem ser aceitos com humildade. Que o bem com o qual te querem precisa ser reflexo do bem que ofereces. Mas a lição mais importante é que tudo isso pode ser ilusório, traiçoeiro e facilmente corromper o ego e comprometer o Evangelho. Afinal, a bondade que olha a si mesma no espelho transforma-se em pedra – Khalil Gibran.

     É cada vez mais claro para mim que poder sentir saudades e poder chorar, são duas atividades da alma, nas quais Deus sempre está presente. Contudo, a vida é o agora. Descobri que existem dois tipos de cansaço: um causado pela falta de espiritualidade, de mística, de elã – é um cansaço terrível. E um outro causado pelo trabalho feito com amor. Para aquele nunca há restauração. Para este, basta um botão que se abre, um fruto que começa a madurar, um sorriso devolvido ao rosto, uma vida que voltou a respirar, uma dor curada... Em suma, a consciência do dever cumprido, pela graça de Deus. E aprendi que as distâncias podem ser maiores ou menores, depende da intensidade de minha confiança em Deus. Atrasos são tolerados, preguiça não.

     Talvez o aprendizado mais exigente, em todos os aspectos, seja o de administrar expectativas. Nem as criar distantes demais do alcance, incorrendo em frustração, nem viver sem elas, contentando-se com qualquer resultado. Dosá-las corretamente é tarefa das grandes e ainda sou aluno iniciante. Aprendi que a decepção faz parte da estrada e preciso avaliar meu grau de culpa antes de desistir. Por fim, o aprendizado mais consolador é sempre este: eu também tenho limites. Resta-me a Graça.