A promessa de Stive
– Ó Stive, entre Brahma e Coca-Cola, você vai de quê?
– Vou de Coca!
A resposta breve e certeira não chega a surpreender seus amigos distantes, que o tem à mesa. Todos eles, sem exceção, sabem que Stive, há exatos um mês, quinze dias e meia hora, tenta deixar de beber álcool líquido e passar à classe dos refrigerantes, atendendo à recomendação da sogra, dos vizinhos e de alguns amigos distantes, que os próximos foram unanimemente contrários a que Stive divorciar-se dos etílicos.
Stive, em uma chuvosa manhã nublada, acordou de ressaca e sóbrio, com uma sede canina, a cabeça ardendo, o corpo esculhambado, o semblante em desarmonia generalizada. Foi à geladeira, à procura de alguma coisa para beber, e encontrou apenas comida e água. Ficou muito decepcionado, exageradamente mudo. Saiu à porta, olhou de soslaio a funesta manhã nublada e chuvosa; verteu-lhe ânsia de vômito, mas não vomitou: ficou na vontade e exageradamente na mudez.
A sogra, os vizinhos e alguns de seus amigos distantes acharam-se diante de excelente ocasião para convencê-lo a expurgar a bebida de sua vida. Pensaram: "Talvez a chuva, em conjunto com estas nuvens nubladas, possa nos ajudar a reforçar nossos argumentos em defesa do combate ao alcoolismo de Stive".
Já haviam tentando diversas vezes, sem sucesso, convencer Stive a abandonar a bebida. Todas, porém, deram-se em manhã ensolarada e de nuvens azuis. Nessas ocasiões, de encontro ao senso comum, Stive não atendia ninguém. Fechava-se em si mesmo, longe de todos e próximo de uma ou várias garrafas de procedência duvidosa. De modo que a sogra, os vizinhos e alguns de seus amigos distantes decidiram mudar a tática, e aguardar uma manhã nublada e chuvosa para reunirem-se com Stive a fim de convencê-lo a abandonar o álcool. Esperaram mais ou menos seis meses pela ocasião, e eis que o grande dia se apresentou, como almejado, nublado e chuvoso. Alugaram uma lotação, e cedo chegaram à casa de Stive, logo batendo palmas e sussurrando:
– Ó Stive... Stive... Stive...
Stive não respondia. Então decidiram abandonar o sussurro e aumentar um pouco o volume: “Ó Stive... Stive... Stive...”. Stive não respondia. Aproximaram-se mais da porta e, sobre incentivos dos demais, um dos integrantes da equipe bateu, com murros grossos e fortes, à porta: “Stive, apareça!”. Finalmente Stive apareceu, com a cabeça ardendo, uma sede canina, o corpo esculhambado, o semblante em desarmonia generalizada, de ressaca, mais ou menos sóbrio e inquisitivo:
– O que fazem aqui, tão cedo, embaixo desta chuva e coberto por estas nuvens?
– Viemos te pedir para parar de beber. Você já percebeu que o álcool te deixa bêbado, insone e sem dignidade? Que, depois do primeiro gole, você já olha estranho para o mundo? Você não percebe que o álcool te faz mal financeira, social e conjugalmente? Deixe pra lá essa história dos supostos benefícios do 0,05% de álcool no sangue e venha ser sóbrio você também.
Stive ficou comovido com o gesto coletivo, principalmente com os argumentos, e prometeu, por Jesus, Nossa Senhora, Ave Maria parar de beber compulsivamente: beberia apenas em ocasiões especiais, tipo: em fins de semana; em seu aniversário, no de amigos, no de familiares, no da cidade, Estado e país onde mora; em batizados, casamentos, bodas de ouro, prata, bronze; em jogos de seu time do coração; no dia da Pátria, no do trabalhador, no dos namorados, no do Índio; no Natal, Ano Novo, São João; no último dia de cada ano; pararia de beber de madrugada, beberia apenas depois do café da manhã; e finalmente, por Jesus, Nossa Senhora, Ave Maria, deixaria de receber visitas em dias chuvosos e nublados.