Coração de Maria.
Que dia triste!
Aqui estou eu, rodeada de parentes, amigos, pessoas conhecidas e uma multidão de desconhecidos. Não obstante tanta gente ao meu redor, sinto-me solitária, com o coração dilacerado pela dor da perda do meu primogênito.
Nenhuma das experiências que vivi nesses anos todos foi mais cruel, mais dolorosa e mais trágica do que os sofrimentos do meu coração nesses últimos dias.
Nunca sofri tanto, nem mesmo no dia em que precisei sepultar o meu marido. Naquela época eu ainda tinha comigo as minhas filhas e o meus filhos Tiago, José, Simão e Judas, hoje cada qual com as suas famílias constituídas.
Não sou mais aquela mocinha pura, ingênua, toda romântica e cheia de vida que ansiava constituir família como qualquer jovem em Israel. As lembranças do passado povoam a minha mente e eu não me furto a elas; todas estão conservadas e devidamente registradas na minha memória.
Há pouco mais de trinta e três anos, movida por um sentimento estranho e uma emoção nunca sentida antes, visitei a minha prima Isabel para ouvir dela, ao chegar na sua casa localizada na região montanhosa da Judeia a estranha saudação a mim dirigida:
*"Bendita és tu entre todas as mulheres, e bendito é o fruto do teu ventre. Mas, qual o motivo desta graça maravilhosa, que me venha visitar a mãe do meu Senhor?"*
Sim, eu engravidara e pouco tempo depois nasceu o meu filho primogênito. José, o meu esposo não cabia em si de contentamento e nós dois estávamos muito felizes com todos os acontecimentos que envolveram o nascimento do nosso primeiro filho. Tão lindo, tão doce!
Cumprimos todo o cerimonial da nossa religião. Fomos apresentá-lo no templo sete dias após o seu nascimento e, ali ouvi algo que me fez estremecer. Simeão me disse que o meu filho seria qual um divisor de águas em Israel, mas em relação a mim, ele afirmou que uma espada traspassaria a minha alma.
Foi difícil digerir aquela palavra, mas hoje eu a entendo perfeitamente. O meu filho primogênito foi alvo de grande crítica e perseguição dos líderes religiosos porque desnudou a contradição que existia entre o que se ensinava no templo e o que se via no comportamento dos religiosos. Por isso O crucificaram como malfeitor, pendurado numa cruz e ladeado por outros dois bandidos.
Esta era a espada a que se referiu Simeão há mais de três décadas e que estava traspassando a minha alma naquele dia fatídico!
Éramos, como se costuma dizer, "marinheiros de primeira viagem" na criação dos nossos filhos que acrescentamos à nossa família. Tanto que numa das nossas viagens a Jerusalém descuidamo-nos de Jesus e só nos lembramos dele quando já estávamos distantes da cidade, após um dia inteiro de viagem.
Claro, voltamos a Jerusalém para procurá-lo e nisso, gastamos três dias inteiros procurando-o por toda parte. Finalmente o encontramos no Templo e a cena ainda me comove.
Nós o vimos e o ouvimos conversando na maior desenvoltura com os sacerdotes e mestres propondo-lhes questões. Todos os presentes, inclusive nós, estávamos maravilhados da sua capacidade intelectual e da sua desenvoltura na exposição das questões da Lei, uma vez que tinha apenas doze anos de idade.
Como precisávamos retornar à nossa viagem, nós o chamamos e o repreendemos dizendo que estávamos angustiados e à sua procura já há três dias.
Ele se voltou para nós e, mansamente nos disse que ele estava tratando de assuntos concernentes ao seu Pai, apontou para os céus e a partir daí entendemos que o plano de Deus era tê-lo com o Messias prometido a Israel desde muitos anos pelos profetas.
Ah! Se eu pudesse relatar aqui tudo o que sinto em meu coração acerca do meu filho Jesus. Quantas vezes eu o vi rodeado de multidões nas suas peregrinações pela Palestina. Quantos milagres foram operados por Ele curando os mais desassistidos dando-lhes nova esperança de vida. Quanto amor, quanta compaixão!
Ali mesmo, pendurado na cruz ele ainda disse: *"Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que estão fazendo."*
Isso é misericórdia e disso jamais me esquecerei.
Sim! Sou Maria, a mãe de Jesus. E ao contrário do que muitos dizem, não tenho em mim nenhum poder, nenhuma autoridade, somente devoção a Ele que me ensinou os valores do Reino de Deus e nesses valores vivo hoje abrigada pela família de João, o seu discípulo mais próximo.
Por que usurparia eu o lugar que Jesus deve ocupar no seu coração, se em meu próprio coração Ele ocupa o Seu lugar como meu Senhor e como o meu Salvador?
Sim, eu o ensinei a caminhar como uma criança normal, mas Ele me ensinou que o Caminho, a Verdade e a Vida eterna são pavimentadas com o seu imenso amor por toda a humanidade.
Que tal reconhecer Jesus também como o Salvador e Senhor absoluto e único da sua vida?
Pr. Oniel Prado
Outono de 2021
09/05/2021
Dia das Mães
BSB/DF