Cafés dizem Boa-Noite III
Fazer planos, nos nossos pequenos planos diários é onde a grande diferença, a enorme distância entre a prática e a teoria se expõe, se mostra real.
Na noite do dia 5, não foi diferente em minha mente, tentar estabilizar numa reta risca toda uma série de acontecimentos comandados por mim, para mim mesmo... Como se conseguíssemos nos comandar. E não foi diferente em minha mente, refletindo em minha alma, expondo em meu corpo. Todos os postos eram simples e fatais: continuar a escrever o conto “Prazeres da Morte”, que já está quase um mês parado, sem rumo, deixar alguns comentários em blogs, visitar o Recanto das Letras, e ler mais algumas páginas do “Punhal de Marfim, e se sobrasse um pouquinho de tempo (já estava considerando impossível esta última etapa, mas sonhar é de graça), tinha de ler um texto sobre atuação, do Stanislavski... Acho que é assim que se escreve!
Mas ao desembarcar do ônibus senti que tudo mudou...
De principio, duas meninas do primeiro período, minhas amigas, vinham da rua, com a maior cara de safada, não perguntei, mas imaginei o porquê daquelas faces disformes em perdição. Fui no banheiro, fiz aquele xixizinho básico, e ao chegar em frente á minha sala, lá estava ma musa, a presidiária completamente sexy! O extremo da sensualidade, do fetiche calado que nos deixa surdo de tanta imaginação, sentada no canteiro, ao lado da Binha, de preto. Cabelo preto, blusa preta, calça preta, e sapato vermelho! Coloquem uma âncora no universo, e peçam ajuda pra Scotland Yard! Chamem o F.B.I, o BOPE, o GATE, a presidiária está armada! Além de fugir do nosso cárcere de cada dia, simplesmente linda, estava de sapato vermelho, vermelho mais que sangue, de lacinho no peito do pé e tudo mais, dois dedinhos faziam a guarda no pequeno buraco do calçado, calçado que acariciava num gesto único sua bolsa de detalhes vermelhos e vacas! Eu nunca mais vou ter a visão que tinha das vacas, achava elas tristes, desiludidas, agora as tenho como alegres, desimpedidas! Porque a presidiária usava vacas sob os ombros, só mesmo ela para ter vacas abaixo dos braços. Era a reencarnação da Betty Boop, eu amo Betty Boop, e a representação perfeita era ela... Bandida de preto e vermelho!
Todos tinham de ir, cada qual com sua as atividades, a Binha aula com o pelicano, a bandida com a “mulher das colunas sociais”. (kkk)e eu aula com o Danilo, não sei o que aconteceu, mas haviam somente 5 alunos, e nem por isso ele deixou de dar aula. Pena que eu não fui na aula, indo para o laboratório, vi na escada um cartaz sobre uma peça de teatro que já devia ter começado no teatro Konder. Imaginei que fosse horrível, não tive nenhuma margem de erro, era muito horrível. Coisa sem pé nem cabeça, teatrinho de escola mesmo, ‘inassistível’. Depois encontrei as meninas com cara de safada, não perguntei, mas aprendi que apenas assistir a algo você já está aprendendo. E mesmo que esteja obscura, entre sombras, há algum aprendizado ali... por mais retardado que seja, e ao virar o corredor, a visão que tive foi da musa novamente, o sol dentre a penumbra daqueles tijolos, iluminou lá do fundo um sapato vermelho no horizonte. Bebemos café, eles mais uma vez quase sufocaram, sussurraram em desespero para tirar-lhes a tampa, me dar um sensual boa-noite, e beber-lhes numa sede fatal, de morte por café em copo de isopor... Sem tampa. Encontramos Nicole Kidman, as incertas de Jornalismo... E o mais incrível é que a presidiária é cheia de luxo e razão quando diz que não tem luxo nem razão alguma!
Ela quer um namorado, eu quero suas palavras e risadas. Ela quer acabar jornalismo, eu quero começar algo a mais em mim... Queremos e podemos, porque sem querer ser repetitivos, somos o James Bond e a Pantera Betty Boop, e isso basta pra desmistificarmos as demais raças, aniquilarmos sorrisos. A UNIVALI é uma verdadeira passarela, aqueles tijolinhos, emoldurados de pisos sem graça, modelitos passam nos chamando para se gabar, e entre Nicoles Kidmans, Angelinas Jolies, e Mary Jane do homem aranha, nossa Betty Bopp prevalece . Revelamos segredos, segredos que os cafés não sabem, de que temos medo , não medo, mas leve receio de subir as escadas. E é subindo as escadas que você consegue ter muitas inspirações, pois cada um sobe ou desce de uma forma diferente, fazendo coisas diferentes, com expressões inacabáveis e inigualáveis. Mas nós tínhamos medo de subir as escadas. E a noite, desejada pra lá de boa por copinhos de isopor, acabou em busca de fotos e ônibus as 21h e 30. E desejei fremente, se um dia tivesse de levar um pé na bunda, que fosse adornado por aqueles dedos em vigília, aquela carne viva, laços em pedestal... Sapato vermelho. Noite azul sem estrelas, café preto e com leite, muitas cores, ternidade e eternidade pra admirar as boas-noites.
Douglas Tedesco – 11/2007