O ARREPENDIMENTO
O ônibus parou de súbito na estrada, já na saída da cidade, as luzes se acenderam, todos se acomodaram em seus lugares. Uma moça bem jovem, loira de olhos claros, posicionou-se na porta principal e chamou a atenção de todos, pediu em primeiro lugar que um rapaz, seu amigo a acompanhasse no discurso. Ela estava muito séria e parecia um pouco nervosa, mas tomou fôlego, dirigiu-se para o rapaz e começou com palavras, que eu não recordo com exatidão, por isso não irei tentar reproduzi-las, contudo seus significados perfeitos se fixaram em minha mente, que diziam:
“Diante de todos vocês, eu assumo meus erros e peço perdão a esse meu amigo”. “Amigo meu, de meus filhos e de meu marido, o qual com palavras torpes e vãs eu ofendi”. “Que a minha iniquidade não prevaleça diante da nossa amizade e respeito, porque acredito que os sentimentos aliados aos nossos gestos valem muito mais que simples palavras, as quais, muitas vezes, confundem mais do que esclarecem, e que isso sirva para todos nós que no futuro seremos bons profissionais”. “Era isso, muito obrigada, a todos vocês!”
Fiquei imaginando: certamente que essas palavras seriam demasiadamente curtas para expressar toda a sublimação daquele momento, porém, eu quero chamar a atenção particularmente para o gesto e não para o momento, é claro que o momento teve seu brilho e ascensão, e isso é inquestionável, mas o gesto por si só, foi algo perto do “Divino ato Humano”. Exagero. Não, apenas reconhecimento. Reconhecimento da capacidade humana em se anular para mostrar seus verdadeiros sentimentos e, por isso mesmo, deixando momentos lindos como esse, sem perceber talvez, a importância desse gesto de tolerância e amor que é ter a humildade para se desculpar.
Vivemos em um mundo cercados por pessoas céticas, onde o sectarismo e a intolerância permeiam dentro de nossas famílias, círculo de amizade, e principalmente no local de trabalho, onde nossos colegas nos veem com olhos de concorrentes e não de parceiros e amigos, que é exatamente o que somos.
A esperança está, não em grandes revoluções sociais, em grandes movimentos conjunturais, ou em grandes gestos fervorosos de destaques na mídia nacional. Nada disso, são coisas simples, gestos pequenos, fáceis de serem entendidos, como um muito abrigado, por favor, com licença, bom dia, boa tarde, te amo, te adoro, são palavras mágicas que estão sendo esquecidas por nós. Nossos pais não nos ensinaram o verdadeiro sentido dessas palavras, e nós também não os estamos ensinando aos nossos filhos, e tudo na vida começa em mim, em você, na nossa família que é a célula magna desse mundo.
São pessoas como essa jovem de atitude positiva, corajosa e simples, que nos dão esperança de perspectiva e futuro melhor. Ao invés de empurrar, abraçar. Em lugar de blasfemar fique calado se não puder dizer apenas te amo. Em lugar de criticar, elogie. É difícil, mas não custa tentar, e toda tentativa é também uma forma de aprendizado.
Não tenho a intenção de cair na esparrela da transformação sociais, longe disso, quem sou eu para tanto. Contudo, faço um apelo, uma pausa para reflexão, principalmente para nossos hábitos que muito degradam a imagem humana e a Pessoa Civilizada que consideramos ter dentro de nós. Tomemos nós também atitudes corajosas, sem medo de achar que estamos fazendo algo infantil ou ridículo, porque ridículo é não saber pedir perdão, é não cultivar o amor e a amizade, ridículo é ficar olhando para trás e lamentando os amigos que perdemos, os momentos felizes que deixamos de desfrutar com nossos entes queridos. Olhemos à nossa volta, vejamos quantas pessoas ávidas por uma palavra compreensiva, elas só querem ser ouvidas, compreendidas e amadas, só isso, nada mais. Guarde seus conselhos, suas opiniões, suas dúvidas, conjecturas, apenas ouça o que as pessoas têm para falar, você vai se surpreender em saber como é fácil ajudar alguém a se sentir melhor sem fazer esforço algum e tornar a vida das pessoas mais alegres só pelo simples ato de ouvi-las.
Naquele dia, no ônibus, tudo que eu fiz foi cumprimentar e dar os meus parabéns para aquela jovem, porém, hoje eu sei que ela fez muito mais por mim.
Obrigado, moça desconhecida dos olhos claros feito luz. Valeu, mesmo!
Leandro Dumont
08.2002