Errático

FRAGIL

Medo

Receio

Esperança

Fragilidade

Temo

Receio

Esperanço

Fragilizo-me

Sob o céu azul as árvores são balançadas pelo vento nesse tempo de morte. O passarinho azul sobre a árvore e o gato que o espreita com seus olhos verdes estão alheios ao meu olhar e ao tempo que me fragiliza. Invejo-os. Estou numa praia bonita do meu passado e uma moça linda caminha pela areia molhando os pés delicados e eu me apaixono de imediato por ela, que passa a ser tudo para mim naquele momento. O meu olhar voa para onde aquela maravilha felina da natureza vai e queria eu naquele instante ter asas para pousar em seu ombro, sentir o seu perfume e brincar com os seus cabelos, mesmo correndo o risco de ser devorado.

Corta para o rio onde me afogo e, antes de minha visão sumir pelo horizonte da linha da superfície d'água, ainda enxergo meu pai de calção azul vindo me salvar. Num sonho meu irmão me fala que ele está sozinho no hospital e Louise entra para me dizer que meu irmão está me ligando, o que só percebo que é real quando ela me acorda e, assim, vejo que o pesadelo e a vida se interseccionaram e meu irmão repete a notícia. Queria correr de jaleco azul para salvá-lo, mas o azul não me pertence e o mundo é tão maior que eu e me devora.

O passarinho e o gato continuam seu flerte fatal e a moça linda sumiu na distância. Conti o ímpeto de levantar e segui-la. Ela vestia azul e a minha sunga era verde, como os seus olhos e o mar naquele dia. Será que eu a verei de novo por aqui? Nunca mais vi. A vida pode ser uma oportunidade perdida. Tão graciosa, movia-se como se toda a felicidade do mundo lhe fosse permitida. E, com certeza, era mesmo. O passarinho voa e o gato parece resignar-se. Olho as arvores e o céu e penso que esse tempo não é justo. Todos os oprimidos e desgraçados ao longo da história universal me gritam em uníssono nesse momento que esse não é um mundo justo e igual e que meu medo não é nada se comparado com a dor deles.

Fito o céu azul e penso que meu pai está perto dele. Não queria ter pensado isso, por Deus, mas pensei, com temor e receio. Ligo para minha mãe e ela está tão triste, sem esperança, mas resignada como uma gata que vê seu passarinho azul indo embora. Os Bacamarte sentem, mas sempre tentam ser fortes e racionais. Minha mãe tem olhos verdes e foi e é uma mulher bonita. Está distante e não a vejo, só ouço sua voz, frágil. E a fragilidade dela me contagia, se mistura com a minha e eu choro ao desligar. Meu pai não poderá secar as minhas lágrimas, mas pelo menos, hoje, eu já sei nadar e sobreviverei. O passarinho azul se distancia cada vez mais no céu.

Cruzo com os olhos verdes de Louise a mirarem-me, amáveis e solidários. Esperanço, pois a esperança é verde como uma árvore firme sobre o solo sendo balançada pelo sopro divino da vida...

Antônio Bacamarte
Enviado por Antônio Bacamarte em 30/04/2021
Reeditado em 30/04/2021
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