Balas de Goma
De bobeira, de malandragem e fome de ver mais seres humanos, estranhos, me coloquei a passear no shopping, nem caminhei muito, e uma cena cotidiana passou por meus olhos, me fazendo esquecer demais coisas, me fazendo regredir. Mãe e filho, pacote de balas de goma, e uma bronca nas escadas de entrada... O menino dera uma bala a um cachorro na calçada, e “o dinheiro dela não era capim”. Ele com toda inocência respondeu: “Mas ele estava com fome, tinha que ter dado mais.”
Eu lembrei da minha infância, de quantas vezes dei comida pra um cachorro na calçada.
Cada criança faz muitas coisas que as vezes os adultos não entendem, mas é preciso compreensão, afinal de contas são crianças, e apenas esta fase, esta idade explica tudo. Crianças são os melhores professores, as mais sinceras. E caso você queira prender a atenção dos mais exigentes ouvintes, teste com uma criança, se der certo com uma criança, vai dar certo com qualquer outra pessoa, com grandes públicos.
E cada criança tem seu jeito, embora haja toda uma comunicação universal, existe a individualidade. Desde pequeno, cada uma tem seu jeito de chamar o pai e a mãe, também a mamadeira. Crianças quando não morrem de medo, adoram cachorros, e também cada uma tem todo um jeito especial de chamá-los. O mesmo acontece com os nomes das pessoas, ótimos apelidos nascem das bocas infantis.
Adorava ir fazer compras no supermercado com minha mãe, íamos no extinto “Marasil”, em minha cidade, e lá eu fazia minha própria compra, alguns itens que considerava indispensável pra sobrevivência, eram eles: dois pacotes de sopa da Galinha Azul, um miojo de carne, um shampoo e um sabonete do Snoop, um creme dental Tandy, e uma caixinha de nuggets, assim era feliz. Outro de meus hábitos era a cada lugar diferente que eu ia, tinha de visitar o banheiro local. Me parecia a alma de uma casa (hoje sei que é a cozinha), mas naquela época parecia-me o banheiro, e assim era também com todas as casas, e estabelecimentos... Restaurantes, shoppings, não gostava de simples lojas de roupa, banheiros de simples lojas de roupa nunca são grandes e bons. Geralmente são sujos e tem alguns produtos de estoque, é horrível. Pegava uma enxada e por todo terreiro (de areia) fazia estradas para os carrinhos de plástico passarem. Quando tomava banho, tentava gastar o sabonete do Snoop na mão até que as pontas daquela maldita casinha desaparecessem para não machucar. E adorava o barulho da máquina de lavar, lembro que uma época minha mãe tinha uma daquelas de madeira, cujo dentro era semelhante ás atuais “faz-tudo”, e então ficava ao lado da máquina a imitando. Mexendo o pescoço para um lado e para o outro, e grunhindo: “ronc-ronc, ronc-ronc”, como fazia a máquina. Minha mãe ainda hoje olha pra máquina e lembra disto, cai na gargalhada. Odiava ir nas lojas, odiava uma em especial: Nunca tinha alguém para atende-lo no balcão, estava sempre vazia, e tinha de se chamar a Dna que estava num quartinho atrás da loja preparando o almoço (detalhe: a loja só abria pela manhã), e de repente, num passe de mágica, quando ela chegava, uns 10 minutos após já ter chego ali, mais algumas senhoras clientes apareciam, e começavam a me torturar, como era uma criança bonita mesmo, de cabelos loiros, olhos azuis, pele rosada, formas perfeitas, me olhavam então e diziam: “que lindo, os olhos então, eu vou me congelar pra casar com você daqui há uns anos...” Entre outras coisas que eu tinha de aturar, imagine, quando adulto ter de casar com uma velha que até então estava congelada! Ninguém merece! Quando chegava em casa, contava tudo para minha mãe dávamos boas gargalhadas juntos.
Mas algo inesquecível eram as guloseimas: o pirulito eu virava cata-vento, aquela bala ácida que vinha em uma tripa, cada qual com um animal em sua embalagem. O sacolé, ou geladinho, a bala soft, quem nunca se afagou com uma bala soft? E a bala sete belo, ainda hoje se encontra, que maravilha! E a bala de goma... Por falar em bala de goma, no dia do shopping, eu entrei rápido e fui numa lojinha de doces, comprei um pacotinho de bala de gomas, e antes que a mãe e o menino entrassem, eu peguei as balas e em frente ao menino dei todas para o cachorro na calçada. Ele sorriu e entrou no shopping me olhando. Com certeza, tanto para mim, para o menino e para o cachorro, foi um dia bem mais feliz.
Douglas Tedesco – 11/2007