O Brasil e a espiral da História

Não nos é possível prever o futuro com base em análise dos acontecimentos atuais, porque os eventos são inesperados pela sua própria natureza.

Porém, observando a História, às vezes ela parece fluir em espiral numa linha do tempo que se cruza, não no sentido dos fatos históricos em si, mas na essência de certos pensamentos e comportamentos humanos, dando a impressão de uma paralisia intelectual.

Se não fosse assim, regiões que no passado foram centros do pensamento humano, como China, Grécia e Roma ainda hoje seriam imbatíveis na produção de conhecimento.

Por que a Humanidade passou por duas guerras de grandes proporções e em um período de tempo tão curto?

Não seria devido a essa paralisia intelectual que fez com que as nações influentes na época ficassem entorpecidas diante do desenrolar dos fatos?

No prefácio da primeira edição do livro Origens do Totalitarismo, em 1950, Hannah Arendt parece que respondeu a essa pergunta: “A passividade de ceder ao processo de desintegração converteu-se em tentação irresistível, não somente porque esse processo assumiu a espúria aparência de “necessidade histórica”, mas também porque os valores em vias de destruição começaram a parecer inertes, exangues, inexpressivos e irreais.” Mais adiante ela diz: “Compreender não significa negar nos fatos o chocante, eliminar deles o inaudito, ou, ao explicar fenômenos, utilizar-se de analogias e generalidades que diminuam o impacto da realidade e o choque da experiência.”.

A autora se referiu aos acontecimentos que antecederam ao surgimento do totalismo na Alemanha e na União soviética.

Curiosamente, a mensagem contida em suas palavras. “Passividade”, “necessidade histórica”, “valores em vias de destruição”, “inertes, exangues, inexpressivos e irreais”, não mostra bastante semelhança com o que estamos vivendo no Brasil atualmente?

Nossa falta de seriedade e passividade na condução de nosso próprio destino é histórica e é o que vem produzindo a lama na qual vivemos atolados e nos mantendo sempre atrasados na História.

Hoje, além desse comportamento autodestrutivo, observamos que parte da população anceia e aplaude atitudes que nos conduzem a insegurança institucional e a completa destruição de valores que, na realidade nem chegaram a se formar completamente.

Ceder voluntariamente os direitos é sinal de que não se tem noção da importância de se “ter direitos” e em última análise, é não saber o que significa “viver”. Seriam valores “inertes, exangues, inexpressivos e irreais”, destruídos em função de uma “necessidade histórica”, qual seja a volta a uma condição que sabidamente nos foi prejudicial?

Temos que usar nossa capacidade de análise, se a tivermos, e tentar perceber em que momento um desastre se tornou uma “necessidade histórica”, movimentando um volume muito grande de recursos humanos e materiais e a quem favorecerá a satisfação dessa “necessidade”.

Existe uma legião de ativistas, entre “intelectuais”, jornalistas, políticos e até ministros empenhados em justificar essa volta do país a uma experiência desastrosa e pessoas comuns que fazem coro a essa situação absurda, que foge a qualquer análise mais consciente.

A atitude dos seres abomináveis se explica por si mesma, mas a das pessoas comuns que apoiam atos que não lhes trazem nenhum benefício concreto é inexplicável.

Fazer de conta que a realidade não existe pode até dar algum conforto ilusório para as mentes acovardadas ou propositalmente alienadas, mas não nos vai levar a lugar nenhum.

Estamos nos deixando dominar por seres que, materialmente parecem que nunca frequentaram uma escola tal sua ignorância dos assuntos em geral e espiritualmente parecem recém saídos do inferno.

Esses são os nossos totalitários, seres que não só são inúteis do ponto de vista da construção de um país melhor, como também perversos de um modo bem peculiar.

Em termos práticos, empresas estrangeiras estão saindo do Brasil, não só pela insegurança com relação a Economia atual, mas também pela cronica teimosia em não nos livrarmos da corrupção, não poder fazer previsões quanto ao retorno de investimentos no médio e longo prazos e quanto a insegurança jurídica, provocada por um grupo de indivíduos cuja irresponsabilidade foge completamente da compreensão de qualquer pessoa que veja a vida com um mínimo de seriedade.

É óbvio que não estamos sendo conduzidos a uma guerra de grandes proporções como as que viveu Hannah Arendt, mas continuamos caminhando para lugar nenhum.

Apesar de sermos um mercado de 210 milhões de potenciais consumidores, isso não nos vai adiantar nada se teimarmos em não aproveitar as lições da História e continuarmos a repetir década após década os mesmos erros elementares.

Argonio de Alexandria
Enviado por Argonio de Alexandria em 24/04/2021
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