Indo trabalhar
Tudo aquilo parecia uma cena de filme.
O ponto de ônibus, as pessoas de máscara ao redor… Quem diria.
Toda realidade estava enfim diferente. Tudo se perdia entre o baile de máscaras que se tornou habitual na cidade àquela altura. Tudo, absolutamente tudo, mudou. E era isso que ele precisava: mudança. E como tudo na vida requer o ato, ele se desprendia entre o desapego e o desamor – as vezes a si próprio, mas na maioria das vezes, com os outros.
O sol nascendo da janela do ônibus, entre o cinza do inverno deixa tudo um pouco mais deprimente, pensou ele escutando rock russo no telefone.
Ônibus esse que naquela hora da manhã já trabalhava com o motor enraivecido, cuspindo verdadeiras chaminés do escapamento do motor. Enquanto o motorista, igualmente enraivecido com o trânsito, dava um gole no café ao lado enquanto chorava suas mazelas no volante. Mais um dia normal – pensou.
Mas o ar pesava naquela manhã.
Pesava como chumbo.
E, enquanto a condução avançava levando um rebanho de condenados dentro dela, ele pensava nas mais diversas coisas e singularidades: Indo de Lampião a Jesus Cristo, ou do penico a bomba atômica, se preferir. Chegou a conclusão de que a vida é muito aleatória as vezes, enquanto via um rapaz da sua idade desmaiado de crack na rua.
E quando, pegando seu café de sempre, e comprando seu mesmo cigarro, na mesma banca de jornais… Tudo parecia em câmera lenta.
As cores estavam em tons acinzentados, quando ele pagou e depois saiu.
E viu que tudo lá fora estava meio cinza também.
As pessoas continuavam suas vidas normais, com a focinheira de pano – lógico. Mas, por outro lado, tudo estava cinza. Até os sorrisos pareciam metálicos, o pagode que tocava às tantas e por tantos dias seguidos nas suas idas ao trabalho, mais pareciam uma marcha fúnebre, sendo escutado em silêncio pelo povo que ia trabalhar. Por mais que fosse um dia como outro qualquer, tudo parecia diferente.
Pensou nas coisas que anda fazendo, tanto as certas quanto as erradas.
Pensou na vida, na morte, terminou o café, o cigarro e foi trabalhar.