Que a tristeza seja a nossa sabedoria, Amém!
Gosto do sentimento de tristeza. Pessoas tristes e pensamentos tristes sempre me despertaram a atenção e admiração. Tenho um afeto em relação com a tristeza de quase superioridade em relação aos outros afetos humanos. Uma admiração nobre mesmo! Claro que isso não tem nada haver com temperamento de melancolia: uma tristeza exagerada e descontrolada. Isso é muito triste, uma forma doentia de viver. A melancolia é um afeto muito mais sério, eu não vou tratar dela aqui nesta crônica agora. A Bíblia é uma narrativa triste. Quem leu sabe do que estou falando. Jesus não era triste, mas se entristeceu com a traição sofrida e seu calvário. Deus se entristeceu com sua criação. Os mitos antigos também são tristes, os mitos gregos antigos nem se fala, a tristeza reina. Os mitos de Édipo e de Prometeu são alguns dos exemplos de tristeza designada pelo destino. As primeiras filosofias da Grécia Antiga e a produção artística (o teatro triste e trágico de Sófocles) também traz narrativas tristes. Não estou sozinho neste sentimento de que a vida é triste. Carrego comigo uma ancestralidade de sábios, antigos e contemporâneos, que me abriram os olhos para esta perspectiva perene da vida humana. Tenho com a tristeza, portanto, um método mais verossímil de observar a vida. Claro que desejo e admiro a felicidade quando ela acontece em minha vida e na vida de outras pessoas. Meu olhar triste sempre deseja felicidade à mim e as outras pessoas, mas não faço do sentimento de felicidade meu projeto de vida pessoal e nem professo utopias políticas de felicidades coletivas e muito menos de felicidades empresariais: o marketing de felicidades otimizadas. Nada mais mentiroso do que autoajuda sobre felicidade. Ela se tornou uma praga, ou melhor, um vício no mundo atual. Seja para a política, na cultura educacional, em empresas ou para vida pessoal. Por isso a necessidade da vivência do sentimento de tristeza e, sobretudo, um olhar metodológico sobre ela. Vivenciar a tristeza não significa procurar a tristeza; nem precisa, ela alcança todos nós de um jeito ou de outro. Vivenciar a tristeza significa entender que ela faz parte do pacote da vida. Que ela está inclusa no viver. Diante de um mundo tão viciado em felicidades, cada um defendendo seus paraísos artificiais de um mundo melhor, a tristeza se torna uma dialética necessária, ou, aquilo que o velho sábio Aristóteles chamava de virtudes do “meio-termo”: os extremos são vícios, a vida exige equilíbrio, portanto, felicidade e tristeza são sentimentos da vida que merecem esta compreensão dialética do equilíbrio. A política se torna um vício, um sentimento extremista, quando apostamos a felicidade somente nela. Nada mais enganoso e trágico. Claro que a política deve proporcionar a busca da felicidade, mas não podemos apostar que ela seja a sua única garantia. Pensar a felicidade somente na política é investir em tristezas futuras. A história está aí para confirmar as evidências que a política é uma arte triste também. Maquiavel, um sábio da Modernidade, já havia nos advertido desta tristeza na política. Não deveríamos ter esquecido dos seus conselhos. Na religião Nietzsche desmascarou como a metafísica, com a promessa de um mundo feliz no além, escravizou uma civilização inteira para aceitar o sofrimento como uma tristeza terrena necessária. Marx foi sábio aquando observou a tristeza econômica numa perspectiva histórica, foi traído quando seus seguidores só viram no seu pensamento utopias de felicidades. Nada mais risível. Que a tristeza seja a nossa amiga da sabedoria, Amém!