Quer jantar comigo? Pt. 2

Mexida, certamente os últimos visitantes não foram muito gentis.

Insisto em preparar a casa, embora a exaustão da insistência esteja pesando às costas, o desespero em não estar sozinha me motiva a continuar o ritual, hoje silencioso, de deixar tudo como deve ser, aos olhos alheios.

Toc-toc. Quem é?

Abro a porta sem muita cerimônia, já não tenho muita maestria na condução da visita, provavelmente nunca terei, mas prossigo com o que posso. Não olho a figura nos olhos, ela poderia facilmente me tomar a casa, certo? Parece… suspeita. Anda pelos quartos, olha os objetos, revira alguns e se dirige até a sala de jantar, sentada à mesa ela me indaga sobre o menu da noite e eu? Já pulava de alegria a este ponto.

Expliquei tudo com a empolgação de uma criança e me empolguei tanto que não notei que ela não estava mais lá. Talvez a minha projeção fosse tão forte que permaneceu após sua partida, mais uma vez se foi.

Toc-toc. Quem é?

Mas já? Nem tive tempo de me preparar, vai ter que ser com a casa desarrumada assim mesmo. Abri a porta e fui olhada nos olhos, ela me pegou pelas mãos e me fez correr pela casa inteira, embora depois tenha demandado tempo para apreciar cada cômodo, incluindo a cozinha, até os ingredientes do jantar, tudo foi motivo de agrado. Sorriso que arrepia gostoso e voz que envolve o pescoço feito echarpe, será duradouro? Jogo ao universo, só recebo as represálias.

Enquanto o jantar não fica pronto me alimento da poesia no ato de esperar, se é que posso suportar o amargo eventual da minha falta de sorte, do que há de mais humana em mim, mastigo, e engulo o orgulho, sozinha. Minha vida é avenida movimentada, estação central de metrô, é casa que recebe, mas não abriga por muito tempo. As idas e vindas me tiram o sono, a vida já não é tão fácil quanto era anos atrás.

Toc-toc. Quem é?

Há sempre um curioso de passagem, no entanto, permaneço estática, me entregando ao devaneio de estar, metaforicamente, acompanhada.