Lockdown

Escute o silêncio dos doentes. Eles sentem o frio dos bips dos equipamentos, eles choram por dentro, ouvindo os passos dos enfermeiros, eles brigam pelo colega ao lado por quem ouviu as últimas palavras: hora da morte, 18:15. Escute o silêncio deste corredor. São macas caladas por tubos e equipos. Bocas mudas de medo e de dor. O alívio é o frasco de midazolam e fentanila. Mas os frascos estão ficando escassos. Ouça o silêncio do empilhar de gente, de gente que sofre calada, aguardando um lugar para se recuperar. Um silêncio amargo, entre o tilintar do relógio, o som do sopro controlado do oxigênio, o bip do oximetro. O silêncio é duro e doído, arranha em todos que permanecem calados diante do pouco que se tem pra dizer. Às vezes, alguém chama e pede por uma única e última ligação, e depois do choro, o silêncio, que ecoa como uma faca no vazio de tristeza de cada um. No silêncio de quem fica, e no silêncio de quem se despede da vida.

Lockdown COVID Curitiba 19.03.21