Feminismo nas ações

Acabei de ler a biografia de Simone de Beauvoir. Um dos destaques da sua vida, como escritora e filósofa, foi a autoria de dois volumes do livro “O Segundo sexo”.. Ela inicia o livro afirmando que a “A mulher não nasce mulher, ela torna-se mulher”. E os dois volumes escritos são para provar esta afirmação em um tratado que aborda vários aspectos filosóficos, biológicos, antropológicos, históricos e sociais da definição de ser mulher.

Beauvoir sempre lutou pelo que quis, sempre acreditou que tinha muito o que fazer e o que contribuir para a humanidade. Ela escreveu isto na sua autobiografia. Mulher de sucesso, independente, que se recusou a casar várias vezes e só se reconhece feminista no fim da sua vida. Seu livro “O segundo sexo” foi usado como referência para as ativistas feministas da segunda onda do feminismo. Não se considerava filósofa e que todos os seus textos eram lidos por Sartre antes de serem publicados. Viveu uma relação aberta com Sartre, tinham outros relacionamentos, mas preservaram a amizade e o companheirismo durante toda a vida.

Ontem, folheando uma revista da Wine (N. 130, Out/2020), li a história do champagne “Veuve Clicquot”. Pode não ser novidade para os enólogos, mas para mim foi e penso que será para muitas pessoas. A tradução deste rótulo é “Viúva Clicquot”. Um champagne famoso no mundo todo, tem o nome e a história de uma mulher.

“Em 1805, Barbe Nicole Ponsardin perdeu o marido, tomou as rédeas dos negócios e alavancou a vinícola familiar, que passou a ser conhecida como Maison Veuve Clicquot. Madame Clicquot é célebre também por várias invenções”, li na revista.

A França permitiu o voto feminino em 1945, e até 1965 as mulheres casadas francesas não podiam trabalhar fora de casa e nem ter conta bancária sem a permissão de seus maridos. Ao falarmos de Simone de Beauvoir, estamos falando da França no início do início do Século XX e Madame Clicquot , início século XIX.

Estas histórias me fizeram pensar no anonimato de várias mulheres no mundo e em tempos diferentes que não se tornaram militantes e nem defensoras da causa feminista, mas fizeram muito com o exemplo. A militância do feminismo fez muitas conquistas, é uma luta boa e justa. É impossível dizer como estaríamos hoje sem estas lutas feministas por igualdade. O conectivo “e se?” aqui, como em toda contingência, é inimaginável.Mas temos que valorizar também as lutas anônimas e individuais. Mulheres que ao invés da militância escolheram a ação e foram bem sucedidas mesmo em um ambiente machista.

Foucault (filósofo francês, 1916-1984) nos diz que a história é escrita pelos dominadores. Talvez seja este o motivo de não termos muitas histórias de mulheres fortes e vencedoras, os homens não queriam que estas mulheres fossem ouvidas e elas silenciosamente foram donas da sua vida e realizaram muito.

Diverti muito sabendo a história do champagne que eu tanto aprecio. Pensem nas lutas e no prazer que esta mulher sentiu ao assumir a direção do negócio da família e dar o seu nome ao champagne. No início do século XIX, na França, uma mulher bem sucedida dá seu nome a um vinho e ainda com o título de viúva. Vinho que bebemos e apreciamos até hoje.

Beauvoir teve um casamento aberto, escolheu não ser mãe e fez uma brilhante carreira. Sua biografia nos permite dizer que existia uma coautoria dela e de Sartre, tanto nos seus trabalhos, como nos dele. Simone produzia como seu companheiro Jean Paul Sartre (filósofo francês, 1905-1980) , considerado um dos maiores pensadores do século XX.

Esses exemplos devem ser destacados e divulgados. Precisamos partir para a ação pois estas ações, mesmo solitárias, fazem a diferença no mundo e na causa feminista

Marcia Cris Almeida

22/11/2020