UM DIA DAQUELES...

UM DIA DAQUELES...

Hoje, acordei triste. Ontem, li os textos das minhas primas Beth e Lúcia, que elas publicaram no Facebook, falando da tia Celma e do tio Claudiano. Bateu uma saudade danada de tudo que já se passou na minha vida e aí resolvi escrever este texto.

Meus pensamentos me levaram à infância, passada em Acesita-MG. Nasci em Acesita, município de Coronel Fabriciano, como diz minha certidão de nascimento. Lá, passei vinte e cinco anos da minha vida; o restante, foram passados em Vitória-ES. Assim sendo, sou meio mineiro, meio capixaba.

Nessa toada, comecei a me lembrar dos meus tios e tias, primos e primas, maternos e paternos, que moravam, e alguns ainda moram, em Acesita, Coronel Fabriciano, Timóteo, Ipatinga, Itabira, Belo Horizonte, Vitória e até na Itália. Meu querido e saudoso tio Afrânio viveu uma grande parte de sua vida na cidade de Terni, a 150km de Roma.

Beth e Lúcia falaram da tia Celma e do tio Claudiano. A memória olfativa é muito forte: lembrei-me da grande mesa de refeições de sua casa e do cheiro do feijão preto servido no almoço: inconfundível, como inconfundível era o cheiro do café das casas da Tiêta e da tia Míriam, em Coronel Fabriciano.

Lembrei-me das minhas leituras de infância e início da juventude, das tardes de sábado que eu passava no alpendre (ou varanda, como queiram) da casa da tia Míriam, devorando os volumes da coleção “Tesouro da Juventude” e os livros da coleção de Júlio Verne (não me lembro se foram todos). Lembrei-me também das incursões que fazia, na casa da Tiêta, na estante onde estavam colocadas, de forma ordenada, as revistas “O Cruzeiro”, edições bem antigas e conservadas, que eu lia e absorvia muitos conhecimentos. Não posso deixar de mencionar que, mesmo proibido pela prima Ilda, eu lia todos os livros de medicina que pertenceram ao meu avô Zezito, farmacêutico que faleceu aos 37 anos, em Ferros-MG. Dos dois lugares citados, eu saía diferente todos os dias, muito feliz por saber (ou ficar sabendo) de coisas que outras pessoas não sabiam. Apenas um detalhe: meus professores passavam alguns apertos comigo e a estes eu peço desculpas por ter sido um menino curioso.

Eu também não podia deixar de lembrar da biblioteca do Colégio General Macedo Soares, à qual os gentis padres salesianos permitiam meu acesso aos livros que somente os estudantes do científico podiam ter. Foi assim que fui me tornando leitor e fui aprendendo sobre o mundo e sobre as pessoas. Não posso esquecer do meu querido pai, Antônio, que comprava, semanalmente os fascículos da revista “Conhecer” que, depois de um determinado tempo, formariam a enciclopédia de mesmo nome. Só de ver a capa das revistas eu sabia dos assuntos tratados nelas. Quase todo dia, um vizinho vinha fazer alguma pesquisa lá, e eu sabia onde encontrar todos os assuntos.

Junto com essas lembranças, vieram as lembranças daqueles que já se foram. Quando a vida inverte a ordem natural dos acontecimentos, toda vez que pais têm o duro dever de sepultar algum filho, tenho a impressão que uma parte da gente morre também, e é enterrada junto com o filho ou a filha querida. Isso vale para quando a gente perde um irmão ou irmã. Assim aconteceu comigo, com a minha mãe e com muitas pessoas, familiares ou não.

Fica, junto com a ausência, uma dor terrível, muito doída, que dói até quando o machucado cicatriza. Depois fica a saudade, que só sabe aumentar. Caso não nos cuidemos, corremos o risco de até mesmo morrer.

Assim, fiz esse texto enorme para falar da saudade, do sofrimento e da angústia que os meses de dezembro, janeiro, fevereiro, março, abril e maio representam para mim há cinco anos. Esse foi o período em que meu pequeno ficou longe dos meus olhos, coisa difícil de acontecer antes. Cada dia dói diferente: uns dias mais, uns dias menos, uns dias mais ou menos, mas dói sempre. Não sei se as outras pessoas têm a dimensão do que eu falo, mas maltrata a gente. Só me sinto bem quando converso com minha mãe: um consola o outro. Eu, a consolo pela perda do Marco Antonio que nos deixou há dois anos; ela, me consola pela perda do Alfredinho, que nos deixou há quatro anos. E, nessa toada, vamos tocando nossos dias...

a.c. sampaio

03.03.2021