Literatura e futebol
Uma vez li o livro ensaístico Que é literatura?, de Jean-Paul Sartre. O escritor e filósofo francês se pôs a dizer que há uma forte relação entre a literatura e o leitor a partir da qual os textos literários se constroem de acordo com as necessidades desse segundo elemento literário, o que se pode dizer que o consumidor desta cultura, assim como os outros, tem a vontade de procurar algo para sua essência ser apaziguada, para seu íntimo ser compreendido. Essa essência pode ser entendida apenas, a meu ver, subjetivamente, pois é algo intimamente ligado aos pensamentos e ao comportamento humano e cada um tem sua visão de mundo.
Nesse sentido, a literatura constrói o entendimento humano de acordo com a visão do escritor e da sociedade em que ele vive, e na escrita o eu escritor se confunde com o narrador, logo a questão da identidade literária entra como um viés de interpretação literária e de mundo que corrobora e explica a complexidade existente nas relações humanas e, consequentemente, socioculturais. No meu dia a dia, percebo o quanto a literatura se aproxima das questões da humanidade, independentemente de como o texto literário é elaborado. O nosso grande crítico Antônio Cândido via que o valor e o significado da obra eram para mostrar aspectos da realidade, ratificando que a estética vem como segunda parte da crítica, pois se vê ai uma relação entre texto e contexto a qual é entendida melhor com o tempo que permite melhorar a análise textual de acordo com desenvolvimento das necessidades e relações humanas.
Muito me pergunto até que ponto a literatura pode envolver-se com os questionamentos humanos e percebo que não há limites para eternizar as ideias por meio dessa manifestação artística. O sujeito como escritor é alguém ligado sempre a seu impulso de questionar tudo a seu redor. Por aí fica cada vez mais claro que tudo pode tornar-se conteúdo de qualquer manifestação cultural, e assim ocorre na literatura. Desde o início de sua teorização com os gregos, passando pela poesia trovadoresca e pelo romance quixoteano, até a literatura contemporânea, o ser humano quis extravasar o que a linguagem verbal não conseguia mais descrever.
Muito me pergunto se há a possibilidade de se misturar literatura e futebol como modo de interpretar parcela da sociedade, pois em muitos países é um dos esportes mais populares. No Brasil, o futebol se tornou tão conhecido e acabou se tornando um dos mais praticados, e o resultado: a seleção brasileira é a que possui mais títulos na Copa do Mundo. Não dá para deixar de notar essa imensa paixão que muitos tem por esta manifestação social. Provavelmente é a maior manifestação de nossa cultura, movimenta massas de torcedores apaixonados pelos seus times, que são capazes de fazer inúmeras coisas para não perder um jogo sequer.
Futebol e literatura combinam de fato por serem um conjunto de manifestações culturais. Muito se escreveu sobre o futebol, e quem assim fez (e com maestria) foi Nelson Rodrigues. Torcedor apaixonado pelo Fluminense, chegou a escrever diversas crônicas sobre o futebol brasileiro que era malvisto por muitos, principalmente pelos europeus, pelo simples fato de haver miscigenação nos times em um país que sempre apresentou diversidade racial.
Falar um pouco sobre esse esporte é necessário, pois não se fala apenas sobre as suas regras, posições dos jogadores, pontuação de campeonato. É algo que vai além. É falar de história, de cultura. Muitos times foram criados após alguém tentar fazer algo nunca tentado antes, o que aconteceu, por exemplo, em São Luís, no Maranhão, quando dois pilotos de avião, o brasileiro Pinto Martins e o americano Walter Hinton, tentaram fazer a primeira viagem entre as américas, dos Estados Unidos até o Brasil. O avião, cujo nome era Sampaio Corrêa II, chegou a São Luís em 12 de dezembro de 1922, e em 25 de março de 1923 surgiu o novo time maranhense para o futebol: Associação Sampaio Futebol Clube (time para qual torço), formado por pessoas simples da classe operária.
A literatura tem a autonomia de descrever as ações humanas por meio das palavras, assim como o teatro faz com a representação, a pintura, com a arte, o que pode ser visto no futebol: uma arte entre jogadores e a bola, uma relação com inteligência de movimentos que, porventura, são feitos criatividade tão usadas por quaisquer outras expressões culturais.