VIVER É... LUTAR !

VIVER É... LUTAR !

"A Vida é luta renhida / que

aos fracos abate / e aos

fortes só faz exaltar" !

GONÇALVES DIAS (trecho)

Sou de um tempo em que quase tudo era "decoreba" nas escolas, tínhamos que DECORAR pilhas de livros, começando pela Aritmética (a velha tabuada... 3x3=9, 3x4=12) passando por História e Geografia -- ainda trago na memória, 60 anos depois, os afluentes do rio Amazonas e os picos do Brasil -- e chegando até a Gramática. Sim, leitores, decorávamos frases inteiras do quadro-negro, mesmo sem saber lê-las.

"Vovô viu a uva", "o rato roeu a roupa do rei de Roma"... assim nos ensinavam as consoantes V e R e as 5 vogais, no tempo da Caligrafia e do mata-borrão. Também decorávamos POESIA, Castro Alves e Olavo Bilac principalmente e meia escola viraria poeta ou poetisa, para desgraça da Literatura nacional. Mas apenas de Casimiro de Abreu e Gonçalves Dias é o que me ficou na memória... deste, o inesquecível e enorme poema "Y-Juca Pirama" traz a lindíssima história do pajé velho e doente ensinando ao filho lição de coragem.

Lembrei disso ao recordar nossa persistente luta para divulgar a Capoeira em Belém -- gastando muito, do próprio bolso -- enquanto os nomes maiores dela "deitavam na cama da Fama" sem fazerem o menor esforço, abrindo Grupos para "outros" ensinarem, estes quase sempre com pouco ou nenhum preparo. Como eu já vendia livros no chão da Praça da República, juntamos o útil ao agradável... vender o material de Capoeira (produto inédito) na Feira de Artesanato instalada no calçadão dela. Eu já tivera dissabores nessa Feira quando, por volta de 1987/88, tentara colocar nela o genial artista vigilengo SÍLVIO GUEDES, iniciando vitoriosa carreira. "Pagamos mico" fazendo exposição dos quadros dele no "Vadião", espaço ao ar livre na UFPA, com os universitários ignorando os belos trabalhos. Pelo menos O Liberal registrou a iniciativa em nov./87 e o quadro que o responsável pela Feira "perderia", esquecendo (?!) num táxi. O tal de Alberto R y R. só "nos enrolou", me fez trazer o rapaz da Vigia, pagar inscrição nela e deixar 1 tela, que seria exibida à Diretoria do Sindicato dos Artesãos, "dono" da Feira. (*1) Não aprovaram a idéia de ter pintura AO VIVO no local... tempos depois lá estava um talentoso caricaturista desenhando rostos e faturando alto.

Por volta de 1992/93 decidimos voltar à Feira, agora para vender a turistas material de Capoeira, nosso acervo e obras de artistas da própria Feira, aos quais íamos encomendar cenas e bonecos dela. Era gerente um certo sr. Mário, cujo filho era "capoeira" e a quem meu irmão emprestava fitas VHS de Rodas e Batizados, quase 40 delas... restaram umas 20, aguardando milagre para serem vistas nessa Internet de tanta bobagem e amadorismo. O diretor da Feira não fez objeção, mas nos deixou nas mãos de uma megera (M. José) decidida a nos atrapalhar em tudo. Pagamos 1 mês de permanência e a cada dia (sábados e domingos) taxa para a montagem da barraca. Ela nos destinou barraca isolada, fora da linha do calçadão, quase invisível, embora houvessem espaços vazios no sábado, nem todos íam. Foram 2 domingos inúteis, quase sem visitas e tivemos que desistir da iniciativa. Logo depois surgiria na Praça barraca de livros e de discos, "idéia nossa", segundo meu irmão. O problema é que a moça exigiu chegar cedo e, como ainda éramos jornaleiros, os fregueses ficavam sem jornal, só fazíamos as entregas de quem pagava por semana.

Voltamos a fazer a exposição na praça, debaixo das mangueiras, eu a vender livros no chão. Eis que por volta de 1994 assume um prefeito qualquer (Xerfan ? Almir Gabriel ?) que resolve perseguir os "camelôs" da Praça e de todos os demais lugares. Fui impedido de vender livros no chão e nossa exposição de "armar os ferros" onde se penduravam os painéis, na época de compensado 4mm, uma estupidez. (Levamos mais de ano assim, antes de substituir por papelão. Os painéis passaram "a tomar sol" na parede lateral do teatro TWH, arruinando parte das fotografias. (*2) Fui a SEMMA (ou coisa parecida) para recorrer, a exposição era CULTURA e não atrapalhava coisa alguma. Mas, "estragava a grama", argumentaram ! Não havia grama no local, a sombra das árvores não permitia isso e um certo "Boizinho" -- em seus primeiros dias -- botava sobre ela 500 ou 600 brincantes, sem reclamações.

Lá na tal Secretaria encontrei na portaria um rosto bem conhecido... na saída devolveu minha carteira (ID) toda amassada, parecendo uma "canoa" ! Retornei à Gerência e êle foi chamado para que me pedisse desculpas. Era um tal de Eudóxio Lenoir, aluno do "Zumbi"... Sérgio Nazaré se meteria em nosso caminho na mesma época, com panfleto criticando RODAS DE RUA (ou a da Praça, especificamente). Escrevi à direção do colégio classe A -- onde êle ensinava Capoeira -- carta entregue por meu irmão, na qual argumentava que na Praça SE JOGAVA Capoeira, se brincava e só havia "guerra" quando praticantes LUTADORES como êle lá compareciam. A Capoeira "só era VISTA nas ruas", ninguém ía a uma academia ou Grupo assistir a treinos.

Já tivera em 1989 um "entrevero" com "Zumbi" em sua academia no antigo DEFIDE, levado para lá por mestre Bezerra. Supunha eu que seria para algum pedido ou agradecimento... me enganei, era a tal "casinha", como dizem por aqui ! O velho me escondeu o assunto, sabia que eu nem iria, nunca temí críticas. Chegando lá, a "Inquisição": de um lado da mesa o "trio parada dura" -- os 2 mestres mais o rapaz da carteira, vulgo "Docinho" -- e eu sendo acusado de "detonar" o Grupo "Rei Zumbi" no CENTUR, onde me ouviam e atendiam.

Argumentei que, ORGANIZADOS, naquele momento em Belém só havia o grupo do SESC e o dele e o SESC não permitia a saída de alunos para nada, com o uniforme, pelo menos. Meses depois, "Zumbi" e nós estaríamos no CENTUR, lado a lado, evento pago, em que êle e 'Docinho" apresentariam sob a lona de um circo belo maculelê de facão e meu irmão outro, "de querosene", empestando o local inteiro e entupindo os narizes da seleta clientela do CENTUR, que não nos convidou para mais nada.

Conheci "Zumbi" em 1987 no SESC da Doca, o entrevistei lá, em evento de 3 dias onde êle e "Docinho" exibiram jogo de navalha irrepreensível, NOTA 10 com louvor, dada por mim, escalado (?!) para jurado do "VIVA ZUMBI, GIRA RODA" (*3), eu que nada era na Capoeira de Belém... e continuo não sendo ! Quanto ao sr. Bezerra, a partir dali perdeu conceito comigo e, hoje, diria eu que já não tem nenhum !

"NATO" AZEVEDO (em 14/fev. 2021, 5hs)

OBS: (*1) - nem chegou a apresentar a tela de 30 x 50 cm (altura) com a imagem de mulher ao estilo Tarsila do Amaral, tendo ao fundo palmeiras psicodélicas e belo cavalo branco. Teria esquecido num táxi ! Por achar a estória suspeita, meti o caso na "Justiça popular" recém-criada, com o nome de PROCON ou DECON, na Av José Malcher... dei azar, com promotora "amiga" -- até a assistente dela levava o sobrenome do traste -- o veredito foi de que "era só um saco de açúcar pintado e, por isso, nem merecia indenização" ! Tempos depois fui ao Mercado de São Brás... adivinhem quem gerenciava o prédio, repleto de cerâmicas de Icoaraci ?!

(*2) - depois que trocamos os ferros e o compensado por cartolina e tubos de PVC pudemos aumentar para 32 os painéis da Exposição itinerante, chegando aos 50, todos muito vistosos, apresentados nas EPs mais importantes de Belém, as que recusavam tinham os cartazes pendurados no muro externo. Em 1993, no CENTUR -- durante Simpósio de Esportes com a presença do ministro Carlos Nuzmman -- "perdemos" 6 ou 8 deles, levados por visitantes audaciosos. O caso findou na delegacia, depois de insistentes reclamações e PROTESTOS nossos, até com cartazes acusatórios, porém nada foi averiguado e nem se recuperou o material, "que está por aí" !

(*3) - por suprema ironia do Destino, desse exemplar evento -- que findou com passeata noturna atrás de trio elétrico -- não restou 1 FOTO sequer. Por obra do acaso tive 2 dele, mas perdi ! O organizador Luís Carlos Moraes teria umas 90... maldita goteira sobre a mala onde eram guardadas inutilizou todas. Por semanas insisti com o fotógrafo que me fizesse cópias do 'VIVA ZUMBI" inteiro. Desconversou, era tudo propriedade do SESC ! Curiosamente, algum tempo depois viria morar duas quadras depois de nossa casa, a uns 500 metros, se tanto e, para nosso castigo, pasei a vê-lo todas as manhãs, indo pro trabalho no SESC, isso por uns 20 anos.