Festa de confetes entre as Ocrims institucionalizadas

Daniel Silveira, deputado bolsonarista do PSL do Rio de Janeiro, é um desclassificado. O vídeo no qual ele ataca os ministros do Supremo Tribunal Federal é um espanto em matéria de grosseria e de falta de respeito com as instituições democráticas, inclusive aquela para a qual ele foi eleito com voto popular. É mostra das mais evidentes do aviltamento da política brasileira, seja nos maus modos como na essência da ignorância que a move.

O deputado, contudo, atingiu o seu objetivo quando Alexandre de Moraes mandou prendê-lo pelas afirmações graves que ele fez no vídeo. Daniel Silveira comportou-se como agente provocador e, nessa condição, suscitou no adversário os seus instintos mais primitivos. A índole de Moraes é autoritária, como provam os seus atos de censura, as suas ordens de prisão e o tamanho do seu apreço pela liberdade de expressão. E foi essa índole autoritária que o levou a decretar o encarceramento de um deputado protegido por mandato popular em flagrante que abre precedente perigosíssimo. De agora em diante, pelo jeito, flagrante delito poderá ser objeto passível de livre interpretação da parte de ministros do Supremo.

O STF julgará a decretação da prisão de Daniel Silveira na tarde de hoje, como já adiantou Luiz Fux. Os votos devem ser veementes em prol da defesa do Estado Democrático de Direito, da Constituição, do próprio Supremo e da honra dos ministros. Provavelmente também se dirá que liberdade de expressão tem limites e se invocará a invasão do Capitólio americano, assim como obviamente as manifestações protagonizadas pelos aloprados bolsonaristas no ano passado, em Brasília, que resultaram no inquérito que propiciou a prisão de Daniel Silveira. Sobrará também para o general Eduardo Villas Bôas, indevidamente usado como pretexto no vídeo do deputado.

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Está faltando, porém, adulto na sala em Brasília. Ninguém pensa nas implicações dos seus atos. No caso em questão, mesmo que seja expulso do PSL, o deputado Daniel Silveira deveria ter a sua prisão em flagrante sem flagrante revogada pela maioria dos deputados da Câmara. Se eles não o fizerem, ficará ainda mais difícil explicar por que, então, uma suspeita de assassinato permanece dando expediente como parlamentar da Casa, assim como um senador se mantém entre os seus pares depois de ser pego com dinheiro escondido nas nádegas. Também passarão a mensagem de que o Legislativo está acuado pela mais alta corte do Judiciário, porque nela estão pendurados vários deputados. Seja como for, Daniel Silveira terá conquistado pontos junto ao seu eleitorado e se tornará o sujeito que enfrentou uma corte que manda prender de ofício, que tem ministros imunes à suspeição — e que se sentem no direito de acolher produtos de crime como provas, além de agredir verbalmente procuradores e ex-juiz, com o intuito de salvar criminosos condenados por corrupção e lavagem de dinheiro. Uma corte que participa de “operações abafa”, para citar a expressão utilizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, também agredido de maneira asquerosa por Daniel Silveira.

Repita-se que o deputado agressor é um desclassificado, uma criação grotesca de Jair Bolsonaro e a sua franja radical. Mas, como agente provocador, vai angariar simpatias por causa de Alexandre de Moraes e o consenso dos demais ministros em torno da decisão de decretar a prisão. O correto seria a Câmara punir o parlamentar, ao fim de um processo por falta de decoro e o que mais pudesse ser. Se o seu vídeo atenta contra a democracia, a sua prisão da forma como foi decretada também a enfraquece. O problema em Brasília não são as instituições, mas os homens que as compõem.