MEDO
 
Estava novamente ali, no mesmo lugar onde ficava todos os dias da semana. Confinada, sozinha e desesperada. Por vezes, era tamanha sordidez da situação, que qualquer movimento ali, parecia suspeito. O medo me torturava. Aquela coisa mostrando-se para mim, cada um dos dentes. Brancos eles não eram, mas tinha umas pintinhas em cada um. O medo me fazia ver aquilo como uma boca de leão prestes a mim devorar. Era cruel demais, o pavor invadia a minha alma, o suor escorria pelo meu corpo em pequenas gotículas. Eu pensava incessantemente que não passaria se quer da primeira porta, caso tentasse sair. Jamais pensei numa situação tão séria, difícil e gritante. Sofria demais ali sem nenhuma ideia do que fazer. Não escaparia do julgamento, mesmo sem ter feito nada de mal, digno de um julgamento tão difícil e inesperado, como eu queria me livrar de tudo aquilo sem passar pelo crivo da lei. Planejei a minha vida arrumadinha e bem adequada durante anos, afinal sou eu Pedrita, aquela que era pedra na comunidade, uma boa leitora, uma intérprete razoável, por que fora fazer aquilo? Mas sabia que cada um tem o destino que traçou e eu fiz isso comigo mesmo. agora estou no mato sem cachorro, tendo que passar por tudo isso. Eu me pergunto: estou preparada? Vou saber ouvir um não? Vou aguentar mesmo? Novamente olho ao meio redor. Procuro uma saída, mas só vejo o de sempre, livros. Aqueles olhos grandes, olhando fixamente para mim, como a se a perguntar porque eu estou nessa situação caótica, sem poder me mexer. Novamente ela me sonda, aquele olhar vazio, profundamente sem vida, esperando o meu fracasso, meu pedido de arrego. Sinto um medo profundo de não saber o que dizer. Há horas que fico matutando, me questionando se tudo valeu a pena. Os esforços, as noites em claro, o cansaço e a solidão. Quantas vezes deixei de fazer algo mais divertido para me dedicar a ela? Meus sonhos estão quase todos perdidos, se eu for julgado incapaz. Sei disso, mas não vou morrer, caso isso acontecer ou vou? Sei lá. Às vezes, penso que aquele frenesi foi estúpido demais, precipitei-me. Poderia ter esperado mais. Pensado mais. Meu tempo, já está se vencendo, estou velha, triste e me sentindo cansada, vazia, sem vida. Agora é tarde para desistir. Já ouço os passos na escada. Estão chegando, ainda dá tempo de fugir. Quem sabe encontre o mundo de Alice? Ou o mundo de Sofia? Bem que meu pai dizia para eu sossegar, pois o meu pensamento ainda me levaria a lugares por onde nunca pensaria em ir. Sou uma pessoa sem respiração, algo me sufoca, meu medo é de um mundo desconhecido, da ilusão perdida, de infância presa aos livros tenha sido em vão. Pressinto que estou perdida, mais que um náufrago, não consigo sair, aliás, o lugar onde estou é bem assustador, meus pensamentos me levam a uma situação de perdedora. Estou bem apavorada, é verdade, com frio, triste, mas as linhas estão sendo preenchidas. Eu sou autora, posso e faço ESCRITA CRIATIVA. O medo de não ter talento me paralisou por anos, agora estou pronta, pode começar o julgamento...





















 
Fátima Sá Sarmento
Enviado por Fátima Sá Sarmento em 08/02/2021
Reeditado em 06/06/2021
Código do texto: T7179742
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.