A fake-news da professora.
O verão, essa estação do ano que estamos vivendo, é terrível para os pobres cariocas, porque o Sol parece estacionar sobre a cidade e não há sombra que dê conta de amenizar a quentura que atua feito estufa, ou melhor, feito autoclave, porque a sensação é exatamente essa, de estarmos dentro de um aparelho hermeticamente fechado cozinhando sob pressão e a alta temperatura; é sério! Ontem eu assisti a reportagem de um comerciante no bairro de Bangu, notoriamente o bairro mais quente da cidade, em que o pobre mercador mostrou ao cinegrafista o tamanho do seu prejuízo, várias cartelas na prateleira repletas de ovos cozidos pela ação da temperatura elevada; tal fato viralizou na internet. Inacreditável para você? Mas foi real! É assombroso? Acredite ou não, aconteceu de verdade. Porque a cidade é do tipo baixada rodeada de morros e montanhas. No verão vira uma panela de pressão. E por conta do aquecimento global, a cada ano que passa a situação se agrava um pouquinho mais, mais e mais. A meteorologia sempre apresenta uma justificativa para esse efeito estufa; esta semana, dizem eles, o oceano na costa da região sudeste está mais quentes do que o normal e há, no local, uma zona de baixa pressão puxando para o solo o ar quente da atmosfera, o que impede a aproximação de frentes frias e a formação de nuvens de chuva. Resumindo: 40 graus no termômetro com sensação de 45 na pele, ar seco, e sem previsão de chuva.
Não bastasse tudo isso, os rios que abastecem a cidade e seu entorno estão poluídos pela falta de saneamento básico e avançam piorando a qualidade da água ano a ano. Neste verão, por exemplo, estamos ao ponto de não ter o que fazer com o produto que nos chega à torneira, isso é quando chega, a não ser: molhar as plantas ou lavar o chão ou dar descarga na privada, porque nem para dar banho no cachorro serve. Para beber então, só comprando galão de água no mercado, do contrário, fica sem beber, inteiramente com sede, não tem outro jeito. Dizem os técnicos da Cedae, a companhia de abastecimento, que é efeito da geosmina; seja lá do que for o líquido é sujo, tem gosto horrível e cheiro medonho. Um inferno na vida do carioca, já imaginou?
Devido à pandemia, as praias do Rio estão proibidas para banho; apesar da interdição e em função da temperatura elevada muita gente ignora a doença da covid-19, desconsidera o isolamento social, invade a areia e se aglomera; não é o meu caso. Embora pertença ao grupo de risco, minha preocupação maior é com a minha coroa, que convive comigo, sua idade é bem mais avançada e ela tem problemas de saúde. Há 10 meses que vivemos no nosso recanto sem a visita de parentes nem de amigos. Quando precisamos sair de casa, só de máscara na cara, sem o que, nem ousamos aventurar de ir pra rua. Vez por outra sinto muito desejo de tomar um bom banho de mar, o impedimento me fez lembrar noutro dia, do meu tempo de estudante, quando ainda ia para a escola de calças curtas lá pelos idos do antigo primário; foi naquela época, por sua vez, que a professora da quarta ou quinta série, não sei ao certo em qual das duas, nos ensinou que, o nosso planeta, ele gira. E eu acreditei, aprendi, passei de ano junto com meus colegas, tudo perfeito. Justo agora, depois de tanto tempo e em plena pandemia, pensei com meus botões contrapondo certa dúvida que, se a Terra gira de fato, como muito bem aprendi no passado, a praia deverá passar por aqui na minha porta a qualquer momento; e por conta desse pensamento fiz plantão uma manhã e uma tarde inteira sentado na varanda, à espreita. Pensou de verdade que a praia passou na minha porta, leitor? Absolutamente! Senti-me tão enganado pela fake-news da professora que nem tive coragem de tomar banho naquele dia. Mas também, não tinha água mesmo. Pobre de nós, cariocas, muito Sol e nenhum motivo para comemorar.