E Agora?

E agora como remediar? Já passa das 4 horas e trinta minutos da manhã, um cabrito berra no chiqueiro, repetidamente, e a minha dor de dente lateja sinfonicamente, a cada berro sinto uma “chibancada” que faz veredas, do âmago do meu experiente molar obturado e sai ricocheteando pelo corpo todo, até atingir o meu fragilizado espirito; parece um aríete... Oh! Noite comprida... parece que estou cumprindo uma pena, tenho a dolorida sensação que chegou o primeiro dia de escuridão, por sinal, como sinal, profetizado por Matheus. Tico e Teco trabalharam a noite toda, refletiram um magote de conjecturas dos nossos novos dias, e que dias, que dias são esses? (...)

No laborar dos meus, flagelados, neurônios, fotografei uma nebulosa paisagem contemporânea, com um acentuado tom, pintado em cores vivas de um inimigo invisível, e que inimigo esse... repeti algumas vezes, que chamou a atenção de Protasov, mas que também não entendeu nada e voltou a “azunhar” o tamborete costumeiro, onde toda madrugada afia as suas unhas. Esqueci de lhes apresentar: Protasov é o meu velho gato, especialista em matar cobras e ratos.

Esse inimigo será vencido? Em quanto tempo? Quem o vencerá? Um inimigo que daria, ou quem sabe dará, diversos filmes hollywoodianos, com diversos e distintos cenários; um inimigo que, como diz um amigo meu, fez o sistema ajoelhar-se, uma partícula do que não presta, fez chefes de estados, “com palavra de rei,” desdizer o que outrora tinham dito, fez o capitalismo entender que existem coisas mais importantes que o consumismo e que o amarelo do ouro não serve para pintar escudos, fez a “cidade eterna” visualizar o seu fim, fez a “cidade luz”, apagar-se, fez a juventude aprender que existe um lar, que os antagônicos deveriam ter hasteado as suas cortinas de ferros há mais tempo, e usar, ao menos em tempos pandêmicos a Glasnost, convidando o seu suposto opositor a uma Perestroika partilhada, onde as fronteiras deveriam ser fechadas apenas para a imbecilidade, jamais para a ciência. Um microscópico espirro maligno, fez lembrar que a ostentação é a última coisa que alguém vai precisar quando se está perto, de como diria o grande filósofo Chicó, do Auto da Compadecida, à beira de “Cumprir sua sentença. Encontrar-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca do nosso estranho destino sobre a terra, aquele fato sem explicação que iguala tudo o que é vivo num só rebanho de condenados, porque tudo o que é vivo, morre”.

5 horas e 17 minutos agora, o crepúsculo começa a deflorar a escuridão dessa particular noite, de extensão transiberiana... faço o nome do pai e agradeço a Deus por ter sido apenas uma dantesca noite e não a apocalíptica, como pensei anteriormente. O infeliz do cabrito parou de berrar, assim como a minha dor no dente, o mesmo só aliviou a dor, depois que o efeito do leite de favela o-anestesiou e o cabrito, imagino, deve ter arrebentado o pau da cancela e, por fim, roubado o leite de alguma cabra, pois o mesmo é enjeitado, comparando ao contexto atual podemos chamar de órfão do mal do século, hoje em dia até os animais tem depressão. Ligo a tv, e logo me arrependo, uma famosa rede televisiva terminou a noite e começa o dia falando da Covid19... saudades do Corujão e da Seção de Gala, nem o Protasov quis assistir.