Uma cidade
          cinzenta e triste



     Hoje, Salvador amanheceu cinzenta e sem graça.Coisa difícil de acontecer. Salvador tem a cara da alegria; é a terra que a felicidade escolheu para morar. Aqui ninguém é triste. A natureza, não deixa, pois, a adotou com carunho; e a música também. Sempre se ouve, vindo do Pelô, um som qualquer; e o mar, misterioso e profundo, que  a abraça por todos os lados, lhe dá uma moldura ampla e irretocável.
     Salvador é definitivamente uma cidade praiana. Mas a maioria (ou quase todas?) de suas aconchegantes praias está in-ter-di-ta-da por causa da Covid19.
     E Salvador sem suas praias livres- citando algumas: de Itapagipe, Barra, Ondina, Rio Vermelho, Pituba, Piatã e Itapoã -  é uma cidade preguiçosa, inerte, parecendo morta.
     Acho que o verão inda não chegou na capital da Bahia. Um dia faz um sol abrasador; no outro, chove. Esta instabilidade climática tira os turistas e os soteropolitanos do mar bonito de Salvador. 
     Com as praias vazias, não tem abará, não tem acarajé  e outras comidas gostosas, presentes dos  queridos e respeitados Orixás.
     Quando morei na praia de Amaralina (que misterioso mar o de lá!) , nos anos 1960-70, fui freguês de dona Eulina, uma baiana abençoada, hoje no céu. Ela fazia o melhor acarajé do mundo. Aqui a homenageio, lembrando-lhe o  nome. 
     Vendo Salvador macambúzia, ou, como diz o outro, "de cara feia", me dá uma tristeeeza!      Mesmo com o céu enfarruscado, dei uma saidinha. Por volta das onze horas, cheguei à orla da Pituba. Completamente deserta. Só a barraquinha de seu Manoel, vendendo coco verde, estava com um acanhado movimento. Nem me aproximei. Tirar a máscara, nem pensar. Segui em frente.
     Essa praia, que não é tão balneária, mesmo assim, em dias normais, recebe muita gente. Hoje, mais parecia um pedaço de mar abandonado.      Nenhuma linda baiana, de maiô ou de biquíni, a enfeitava. Zero!
     Apenas uns marmanjos jogavam bola. Um baba, como dizem os baianos. Parecendo o Ba-Vi dos tempos modernos, que , pela sua baixa qualidade, não leva o torcedor à linda Fonte Nova. 
      Nuvens plumbosas, vindas de não sei d'onde, despontavam no horizonte distante. E a cidade, já amortecida, escurecia lentamente. Pingos grossos obrigaram-me a voltar para casa, correndo. Cheguei botando a alma pela boca. 
     Foi esta a Salvador que vi hoje de manhã .      Guardei-a na memória para mostrá-la, sem tirar nem pôr, nesta  modesta e indiscreta crônica, que você, leitor amigo, acaba de ler...

Foto - Do Terreiro de Jesus - Centro Histórico de Salvador. Igreja e Convento de São Francisco.    
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 27/01/2021
Reeditado em 28/01/2021
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