O vestido de noiva
Foram várias provas. Sempre de pé, num pedestal, parada majestosamente como uma princesa posando para fotos da realeza. Meses até ficar perfeito. Branco como deve ser, com bordados delicados estrelando a cauda e um pouco mais denso e glamouroso pelo corpete tomara que caia, de onde partia uma alça única a esquerda, dando apenas um charme ao modelo, não necessariamente uma sustentação.
Um dia antes do grande evento era o combinado para a retirada do vestido, ou seja, na sexta no início da tarde já estaria disponível. Os útimos ajustes tinham sido feitos e estava justo como deveria ser para a segurança de um tomara que caia. Os bordados devidamente pregados dando o efeito desejado.
"Fizemos um ótimo negócio!" diziam a noiva, a mãe e a irmã da noiva, orgulhosas do preço modesto pago por um vestido daqueles. "Valeu a pena o stress...!" referindo-se aos problemas enfrentados durante a confecção, com mudança de endereço da loja, suspeita de dificuldades financeiras, receio em não receber o vestido...mas deu tudo certo!
Na sexta a tarde o vestido já estava pendurado no quarto da noiva, admirado por todos, causando na família um misto de satisfação e ansiedade. A noiva resolveu dar a última provadinha, fingir que jogava o buquê, ensaiando já com o figurino seu papel de protagonista do espetáculo.
A irmã e a mãe se posicionaram, encenando solteiras ávidas por uma esperança de casamento certo e começaram a contagem: "Um, dois e .....já!"
O buquê improvisado fez uma parábola aterrissando nas mãos da irmã enquanto a noiva, perplexa, via seu vestido também aterrissar, abaixo de seus peitos, no exato instante em que seus braços se jogaram para trás. "Cortaaa!", diria o diretor e nesse momento todos, estáticos, se entreolharam.
"E agora?", a noiva olhou para as duas mulheres boquiabertas... e começou a se requebrar fingindo dançar na festa, testando mais um movimento arriscado, enquanto o vestido descia mais um pouco a cada rebolada nos quadris. "Isso que dá comprar vestido barato...!", lamentava a irmã indignada...o primeiro pensamento nessas horas é voltar à loja, exigir uma solução imediata, brigar e chorar...mas a única certeza era de que ela não arriscaria voltar lá e tudo piorar, seguindo o ditado de quanto mais mexe....
A noiva respirou fundo, se armou de bom humor e pensou em soluções. Foi ao guarda roupa, procurou coisas possíveis de serem usadas e voltou com uma idéia. Uma cinta ortopédica para coluna que parecia um espartilho poderia prender o vestido no corpo. Mas costurar o vestido no espartilho dificultaria sua colocação. Pensou mais um pouco ..."Velcro!!" E foram os quatro para o bazar, o pai dirigindo, a noiva guiando o caminho, a mãe esperançosa e a irmã lamentando a compra barata...
A segunda etapa era a mais dificil: costurar à mão aquele velcro duro no vestido e na cinta ortopédica, já que não tinham uma máquina de costura. Revezamento para descanso dos dedos que doiam com a força que faziam para a agulha perfurar o velcro. Já era fim do dia de sexta, e o receio de não dar certo martelando a cabeça da noiva, pensando num plano B, ainda fazia os dedos sofrerem com furadas de distração. Finalmente, terminado o trabalho, prova de fogo: jogar o buquê novamente e dançar uma lambada, rebolando até o chão!
Sobre o resultado de tudo isso? Saiba que a noiva dançou em seu casamento como se não houvesse amanhã, feliz, radiante, nem se lembrando do apuro do dia anterior! Era como se o velcro tivesse fundido o vestido em seu corpo e virassem um só, fazendo-a experimentar um sentimento tamanho de liberdade que parecia estar dançando nua em seu próprio casamento!