A PRINCESA JUREMA E O PRÍNCIPE SAPO
Era uma vez uma princesa que vivia no seu castelo, em companhia do rei e da rainha. Quando atingiu a idade de casar, já era famosa por sua beleza. Bardos vinham de todos os cantos do mundo procurar inspiração em seus traços puros. Príncipes de reinos vizinhos faziam fila para beijar-lhe a mão nos bailes. A criadagem do castelo fazia tudo o que ela queria. Mas ninguém achava o caminho para seu coração.
Certo dia, em visita ao Reino Paradoxal, Jurema passeava ao redor do tanque de peixes com suas três melhores amigas, quando avistaram um belo rapaz a passar os dedos pela superfície da água. Aproximaram-se. Era o filho do rei e tinha um físico forte e maneiras doces. Passou a manhã e a tarde na companhia das moças, e foram as horas mais agradáveis que se pode ter.
No banquete da noite, esperavam vê-lo, mas ele não compareceu. Sua ausência foi atribuída a ordens médicas, com as excusas do rei. Mas, na manhã seguinte, tornaram a encontra-lo no mesmo lugar e um romance foi se formando. Assim continuou por mais três dias até que ele, falando-lhe ao ouvido, pediu: _ Deixe suas amigas e venha sozinha amanhã, se de ti mereço apreço, para que possamos falar a sós.
Assim fizeram e, enquanto passeavam pelos jardins, ouviu o que já adivinhara: o príncipe queria casar consigo e, se lhe aprouvesse, o pai faria o pedido formal no banquete da próxima lua cheia. Tomada de emoção, a menina pediu-lhe tempo para pensar. Em seu coração já o aceitara. Mas queria contar para as amigas primeiro, pois desde crianças tudo sabiam umas das outras.
No dia seguinte, de novo o encontrou sozinha e, indagando do porquê de nunca vê-lo à noite, recebeu a seguinte resposta: _ Durmo muito cedo para apressar minha convalescença da doença dos pulmões, amada minha. Entretanto, um outro motivo me afasta de si por este período, e depois que estivermos casados, eu lhe direi. E assim continuaram a passear e sonhar com o futuro.
Mas as amigas tinham novidades. Passaram o tempo a ouvir as conversas da corte e alertaram: _ Cuidado com seu coração pois pesa uma maldição sobre o herdeiro deste reino. Que se acautelasse. Era um encantamento que só podia ser quebrado por transferência. Nervosas, elas tentaram imaginar que encanto era este. Não conseguiram arrancar uma pista de quem quer que fosse. Pensativa, sem conseguir dormir direito naquela noite, Jurema seguiu ainda antes do romper da alvorada até o tanque de peixes. Chegaria adiantada para o costumeiro encontro. Faria uma surpresa. O dia seria lindo e começaria bem.
Naquele exato momento, um sapo saía da água. Parou perto dos arbustos, esperando que o animal saísse de perto ou voltasse para o tanque. Para sua surpresa, o sapo parou ao lado de um montinho de roupas e começou a aumentar. Quanto mais aumentava, mais mudava de forma. Em poucos instantes o príncipe estava lá, nu, ainda molhado e definitivamente ele mesmo.
A princesa estremeceu de horror. Agora sabia qual era o segredo reservado para sua noite de núpcias. Homem durante o dia, anfíbio durante a noite. E sentiu pena. Tanta juventude e beleza subjugadas por uma praga cruel. E, de novo, aconselhou-se com as amigas.
_ Se só pode ser quebrado por transferência, alguém vai ter que suportar a maldição no lugar dele, disseram elas. Caberá a você sofrer a transformação todas as noites. Pensando em tão terrível destino, Jurema pôs-se a chorar. Não desejava virar sapo, apesar de seu grande amor; e não podia permitir que o príncipe continuasse a carregar tamanho fardo. Deliberou com as amigas encontrar o feiticeiro e negociar o fim da maldição.
Diligenciando as quatro, logo batiam à porta de uma casinha cinzenta equilibrada num penhasco rochoso, que cheirava a ervas ainda do lado de fora. Ao abrir a porta, o feiticeiro já sabia quem eram elas e o que buscavam, saudando-as com cortesia. Como se mostrasse uma pessoa digna e nada indicasse um coração malvado, pediram as meninas, também com cortesia, que libertasse o príncipe de sua terrível sina.
_ Há duas formas de quebrar o feitiço, ó princesa do reino de Sempre Será. A primeira é por transferência, quando uma pessoa que o amar verdadeiramente se casar com ele. A segunda é por dissipação, ao cessar todo o sofrimento que o príncipe causou. Pois em suas noites e dias, desde muito cedo, dedicou-se aos vícios. Desgraçou muitas donzelas, entre nobres e plebeias, recusando abrigo às que foram expulsas por seus pais e qualquer migalha de assistência aos filhos que engendrou. Choram até hoje as filhas desonradas e seus pais que as amavam. Choram crianças que crescem sem carinho ou segurança, por vezes enfrentando problemas grandes demais para sua idade. Assim como haverá de chorar o reino Paradoxal, se tiver tal sorte de herdeiro comandando seus rumos.
E a princesa Jurema, ouvindo aquilo, sentiu o coração se partir em dois. As amigas, vendo-a perder a cor, acudiram como se fosse um desmaio, elas mesmas horrorizadas com a triste história. Mais ainda se considerarmos que o príncipe pretendia transferir o feitiço para Jurema de forma insidiosa e vil.
A comitiva de Sempre Será abandonou o reino Paradoxal naquela semana. E, dois anos depois, a princesa se casava com o herdeiro do reino Equilíbrio. E, embora uma parte de seu coração sempre voltasse à imagem do príncipe sapo, foi feliz e viveu longos anos com muita disposição. Fim.
Tangará da Serra, 12/01/2021.