UMA MÃO DÁ A OUTRA TIRA
Deu com uma mão e tirou com a outra. Já ouvi muito dizerem isso. Talvez o meu assunto não enquadre bem nesse dito, pois acho que no meu caso o mais certo seria: Deu uma parte e negou a outra.
Dos meus doze pros quatorze anos trabalhei um bom tempo na feira livre.
Nesse período tive alguns amigos e entre eles esse rapaz, que contava talvez dezesseis pra dezessete anos.
Dá pra dizer que a natureza foi generosa com ele, o sujeito era bem bonitão mesmo, além de um porte físico invejável; parecia ator principal de filme romântico, teve também a sorte que não tivemos, era filho de proprietário de banca de roupas, além de dinheiro, tinha sempre as roupas da moda.
Junto com esses dons vieram a arrogância e uma precária formação moral, talvez. Menino mimado que tinha o que queria.
Saíamos juntos e parei, pois ele rotineiramente se metia em confusões, em alguns casos pelo ciúmes que despertava nos outros, ele não costumava respeitar, mesmo que a moça que ele se interessava estivesse com alguém.
Na época a Luta livre estava no auge e ele entrou para uma academia para treinar essa luta.
Parei de trabalhar na feira, não tive mais contato com ele, mas sempre me contavam das coisas que ele aprontava, não era raro a notícia de que ele havia surrado esse ou aquele em algum lugar.
Alguns anos depois me chegou a notícia de que depois de desaparecido por uns dias seu corpo foi encontrado bem longe de casa, foi baleado por um sujeito que ele havia surrado uma certa vez.
Então, a mão da natureza deu a ele coisas boas, a mão da sua formação tirou tudo o que lhe foi dado.