MÁSCARAS.
Erguido entre o céu e à terra, o vento soprou-lhe na face. Quem foram aqueles que presenciaram o histórico momento? O desfigurado rosto perante a insana multidão mascarada, mãos perfuradas e trêmulas e o sangue correndo no madeiro cru. Estava ele ladeado de ladrões, cercado de rudes soldados. De quem eram os olhos que contemplaram tamanha dor? Pendurado, despido, coberto de grandes chagas. De quem eram as sandálias que pisaram o mesmo chão que o seu inocente sangue regou? Esmagado entre a agonia e a dor, condenado foi por ser o próprio amor. De quem era as mãos que deu aos seus machucados lábios o fel do amargor.
Erguido entre o céu e à terra, a rude coroa perfurando-lhe o crânio, sangue e suor a se misturar. Em sua mente, lembranças, de certa parábola, de um homem que assaltado foi, espancaram-no quase a desfalecer. Ali no chão ele sangrava, passava por ali um sacerdote com máscaras de santidade, fingiu não viu, passou também um levita com falsa bondade, fez a mesma coisa que o religioso, caído ele continuou. No mesmo lugar veio o samaritano, este trazia seu rosto cru, quebrando todos os protocolos, ajudou o homem que ali sangrava. Derramou-lhe azeite nas feridas, dele cuidou como nenhum outro fez. Eram essas as lembranças que vieram à mente daquele que fora colocado na dolorosa cruz.
Erguido entre o céu e à terra, os ombros que em carne viva estavam, carregava o peso do pecado do mundo, inclusive daqueles olhos que sem piedade o acusavam. Quem eram aqueles que ali estavam? Não conhecemos os seus nomes, apenas sabemos de suas máscaras, das quais ainda hoje as utilizamos.
Erguido entre o céu e à terra, o seu olhar de amor contemplou aquele com falsa santidade, que se dizia sacerdote, no entanto, mostrava ao pé do madeiro sua verdadeira face.
Quem de fato o amou?
Erguido entre o céu e à terra, o seu olhar de misericórdia viu apenas um dos doze que escolheu, também contemplou a espada que transpassa o coração de sua doce mãe, Maria chorava copiosamente. Onde estavam aqueles que com tanta devoção o seguiram? O seu olhar não era de condenação; “Perdoa-lhes, pai, pois, não sabem o que fazem”. Essas palavras ecoaram pelos séculos, porque os homens não continuam sabendo o que fazem. Diante do madeiro estávamos todos nós. Com nossas máscaras de mentira, que não refletem nossa verdadeira imagem.
Erguido entre o céu e à terra, pagou a nossa vida com a sua, enquanto trocamos alegremente nossas máscaras por outras ainda piores. Ousadamente dizemos que não as utilizamos — vejam caríssimos leitores — vestimos uma verdade fantasiada, falamos palavras contrárias aos que está oculto no coração. Diante do eterno, praticamos esse teatro de sombras com tamanha maestria que assustariam atores renomados.
Erguido entre o céu e à terra, perfurado, sangue e água, é a fonte que lava os pecadores, que os livra dessas infernais máscaras, desse perigoso teatro das sombras. O ano iniciou e nada mudou e nem vai mudar. Que as palavras desta indigesta crônica nos faça refletir, de quem realmente somos quando deveríamos ser. São os olhos cegos destes líderes loucos a nos guiar para o abismo diário.