Disparada!

Prepare o seu coração. Avisava Geraldo Vandré antes de dizer, meio que o óbvio, mas que tem um grande significado quando estamos vivendo um momento de alienação, onde as pessoas esquecem que não podem ter controle quase que geral das pessoas. A prosa pode não agradar, principalmente por ele ter vindo do sertão. Geralmente não nos ouvem, geralmente servimos quase que apenas para trabalho braçal, essa é a nosso estigma.

Mas temos algo para acrescentar... Afinal aprendemos a dizer “não”, e até pelo descaso relativizar a morte. Aquela Severina, comum, tão comum que já não nos causa tanto espanto. Aquela morte que quando chega, cobrimos o corpo e seguimos, como se nada tivesse acontecido. Vemos a morte sem chorar. A morte, o destino e tudo estava fora de lugar. As pessoas estavam morrendo a torto e a direito. Não à toa tal prosa foi feita na ditadura, e a denúncia era uma tentativa de consertar o que estava de errado. Utopia, sonho? Talvez. Mas em casos de injustiça, quando não nos posicionamos, estamos escolhendo o lado opressor da causa, por isso é necessário a opinião, o posicionamento. Principalmente por pessoas que na boiada já foram bois, e que, por uma situação adversa (a morte de um vaqueiro), a deposição de um presidente eleito democraticamente (golpe de 1964) ou até mesmo privilégios obtidos através de sua posição social em uma sociedade machista, homofóbica e racista, se montaram e viraram dono da boiada.

Não é nenhum pecado ser dono de boiada, e assumir uma posição de destaque, seja na empresa, escola, na própria sociedade, na política (temática da música), desde que suas raízes não sejam esquecidas... As raízes nos mantêm no chão por uma razão simples: por mais que nossas folhas, galhos e frutos estejam quase tocando o céu, nas nuvens, o que nos sustenta são as raízes. É preciso nos vestirmos de Francisco, e voltarmos às bases, à sociedade marginalizada. E foi isso o que fez o nosso recém vaqueiro ter acordado, ele percebe que não pode seguir nesse lugar tenente, lugar onde se trata gado igual gente, “gado a gente marca, tange, fere, engorda e mata, mas com gente é diferente”. O exemplo do vaqueiro é objetivo e único, como diria Taiguara, “sou carne, sou osso, sou gente”.

A música é claramente uma alusão à ditadura, onde direitos foram perdidos e atrocidades foram feitas em nome de um projeto de poder maior. Uma pequena elite mandando, tratando as pessoas e os opositores como gados. É uma alusão histórica, que talvez seja cotidiana... Que essa música faça a gente pensar nossas práticas enquanto cidadãos, professores, filhos, pais, donos de estabelecimento, políticos, seres humanos. Não podemos marcar, tanger, ferir, engordar e matar. Geraldo, na voz marcante de Jair Rodrigues, eterniza. Com gente é diferente!

https://www.youtube.com/watch?v=BjAQxSXAmU8