Não quero ter filhos
Discuti com minha vó. Ela "não é normal uma mulher não querer ter filhos". Ela de novo "a mulher que não quer ter filhos tem um problema".
Decidi não colocar mais esse assunto na mesa. É uma discussão cansativa de gerações diferentes.
Não quero ter filhos. E daí? Por que as pessoas se ofendem tanto com essa decisão?
Não costumo me justificar mas como aqui é um texto, irei listar meus motivos:
Não gosto de me importar com as pessoas a ponto de doer. Pois o amor de mãe dói e muito. Dói quando o filho recusa o bico, dói quando a criança da seu primeiro chilique, dói quando somem, dói quando te desrespeitam, dói quando o filho não respeita a companheira, dói quando o filho não manda mensagem dizendo que tá tudo bem, dói quando o amor não é retribuído da mesma intensidade, dói perder o filho, dói perder o filho para o suicídio, dói perder o filho para o homicídio, dói perder o filho para as drogas e dói perder o filho para o crime. Preocupações, culpa e dor. São esses sentimentos que nascem numa mãe. Existe o amor. Aquele amor incondicional. E muitos vão alertar de que eu nunca sentirei um amor tão forte. Não discordo. É lindo o amor de mãe. Mas eu não quero. Não quero a intensidade da maternidade.
Tenho horror a dor do parto. Não me acharia bonita grávida. Parto normal ou cesariana existe chances de ter uma violência obstétrica. Não ia gostar do processo da gravidez. Não ia querer amamentar. Sem contar na possibilidade de depressão pós parto.
Não quero um ser dependente de mim durante anos. Infelizmente é impossível calcular por quanto tempo.
Não quero educar. Na teoria, educar é o máximo. Na prática, um bocado mais difícil de exercer. É necessário paciência, persistência e repetição. Ainda assim não é garantia de êxito na aprendizagem.
Filhos custam caro. Eu não sou de gastar muito, com filhos seria inevitável. Roupas, brinquedos, saúde, alimentação, educação. Sem contar que teria que lidar com a negociação quando a criança decidir se jogar no chão caso não queira comprar o que ela quer.
Criança chora. Criança faz birra. Criança pode ser bem manipuladora e má. Tenho pouco jeito com crianças. Eu as trato como um adulto pequeno. Não sei adular.
São companhias dispensáveis. Não quero ter 24h um bebê, nem uma criança e muito menos um adolescente. Posso trocar ideia com pessoas de variadas faixas etárias mas prefiro conversar com gente da minha idade para cima. Se a criança fosse um Benjamin Button, iria me entrosar mais. Se meus filhos nascessem com 30\40 anos sem depender de mim, seria maravilhoso. E aí seriam qualquer coisa, menos filhos.
Depois que o filho cresce, eles podem dar pitaco na sua vida. Principalmente se você for velho.
Você não estará sozinha. Pelo menos, durante uns bons anos. A ideia de não poder ficar só, me deixa angustiada. É tirar uma parte essencial de mim.
Eu não gosto de cuidar. Não gosto de ter que preparar comida todos os dias, nem dar banho, nem vestir, nem levar aos lugares, nem mandar tomar banho e fazer a tarefa.
Você terá que sempre está pronta. Ou para uma emergência, um dever de escola, uma briga mal resolvida, comida. Se você não for privilegiado, não terá uma empregada. Logo você estará sempre fazendo alguma coisa para casa ou para o bebê.
Seria injusto ter filhos esperando que eles cuidem de mim na velhice. Primeiro que velhice não é doença. Segundo, mesmo com filho, iria preferir me virar só. Caso fosse necessário, contrataria uma cuidadora de idosos.
Eu sou pacata. Não iria gostar de ter que ir a escola trocar ideia com outras mães nem conhecer os amigos do meu filho no parquinho. Recusaria convites para festa infantil e também não iria gostar de fazer festa por causa dos valores.
Eu tenho um problema psiquiátrico. Ter um filho biológico aumenta 50% das chances de nascer com o mesmo diagnostico. Tô de boa de ter um mini eu por aí.
Meu filho pode me culpar pelos seus problemas. Eu posso culpar meu filho pelos meus problemas.
E por fim, não quero ter filhos por causa da sociedade misógina. Sociedade que comete violência obstétrica, trata a mãe como parideira sem emoções. Uma santa que não transa, se mete na vida do que deve, pode ou não pode fazer. A mãe é vigiada. Não acha cedo ter um encontro no tinder? O que a família vai pensar? Tenha outro filho, vai deixar o menino sem ninguém pra brincar? Esconde esse peito, rua não é lugar para amamentar. Quando você saí, deixa seu filho com quem? Quem é o pai do seu filho? Não casou por que? Mãe solteira. O pai ajuda? Ah, ele da pensão! Você deveria agradecer porque nem isso os homens fazem. Vai usar biquíni depois que pariu? Corajosa, hein? Não leva homem para casa, seu filho pode estranhar ou se apegar. E se vocês terminarem? Come x coisa que é ótimo para o enjoo. Não come x coisa pois pode piorar o enjoo. Vai viajar? Mas seu filho só tem 1 ano! Onde ta seu filho? Não da doce para ele! Olha a idade do menino! Ah, tem que dar doce, deixa o menino curtir um pouco. Que barriga linda, posso tocar? Ele fica esse tempo todo na casa do pai? Pra você trabalhar? Mas você é a mãe!
Existe a possibilidade de arrependimentos. Existe a possibilidade de não encontrar o amor incondicional no filho. Existe a possibilidade de não gostar do meu filho. Existe a possibilidade de sermos dois parentes que se estranham muito. Ter filhos é uma escolha. Uma decisão. Necessário pensar bastante antes de ter. Filhos não se pode devolver ou trocar. Admiro as mães pois educar uma criança é uma tarefa engenhosa. Trouxe essas justificativas mas no final não quero ter filhos porque não. Porque se eu quisesse mesmo, todos esses motivos seriam pequenos diante do desejo de ser mãe. E se todo mundo pensasse muito antes de ter um filho, talvez, o mundo seria um lugar melhor de viver.