SOLIDÃO COTIDIANA
Sabe a sensação de estar sozinha, completamente só, e ser aconchegante? Olhar em volta e não ver ninguém? Ligar a TV por algum receio, e gargalhar pela sua idiotice rotineira? Essa sou eu nas madrugadas. Eu gosto das madrugadas, são vazias e nelas tento ser também. Tem um vácuo imenso, um eco ensurdecedor, mas tem silêncio em mim. Puro silêncio em mim. Brinco que sou duas peças, duas metades inteiras que se encontram depois das duas da manhã. Dos ruídos duma cidade e dum relógio gigante na parede tudo me distrai, ali não. Quando estou com elas e sorrio ou me emociono, eu penso em mim. É quando me encontro. É quando sou eu. Eu choro nas madrugadas, em quase todas elas. É como se eu me encontrasse pra sofrer. Nessas horas, pareço um fracasso inalterável, e me consolo. Choro por coisas absurdamente banais, e me acolho. Tento racionalizar, racionalizo e sofro. Sofro a ausência. Sofro minhas invenções amorosas. Sofro meus espaços em silêncio numa sala cheia de gente. Sofro minhas vulnerabilidades completamente seguras junto ao sutiã. Sofro a falta de gente num mar de pessoas. Sofro, e me esvazio, e me junto ao eco.