POETA MAURÍCIO MARZULLO

NA VIRADA DO SÉCULO XX, UM SONETO

AINDA COMOVE UM LEITOR

Nelson Marzullo Tangerini

Em 1999, através de carta, pedi à minha amiga Marisa Fillet Bueloni, colunista do extinto jornal O Diário, de Piracicaba, SP, que publicasse, em sua coluna literária, o soneto Minha mãe, de meu tio, Maurício Marzullo, dedicado à sua mãe, a atriz Antônia Marzullo.

Eis aqui o referido soneto:

"MINHA MÃE

À minha mãe, Antônia Marzullo

Quando, nostálgico, a rezar me ponho,

elevando a Jesus a minha prece,

como se fosse tudo um grande sonho,

a minha mãe querida me aparece.

E, ao vê-la tão divina, eu me transponho,

da tristeza malsã, que me embrutece

o coração, para um viver risonho,

que em seguida, porém, desaparece...

E as minhas orações tão comovidas

transformam, por encanto, as nossas vidas

numa existência bela, sacrossanta,

Pois que eu enquanto rezo me debruço

ante teus pés, ó mãe, e num soluço,

proclamo que sou filho duma santa!"

Fomos, porém, surpreendidos com uma carta de um leitor paulista, Sr. Fernando César Pereira, que, emocionado, escreveu-nos a seguinte cartinha que ora publicamos:

“Piracicaba, 30 de novembro de 1999

Caro Marzullo,

Venho, por meio desta, à sua presença, para tomar um pouquinho de sua atenção e seu tempo.

Não se admire, é a primeira vez, nos meus sessenta anos, que escrevo a um poeta.

Mamãe faleceu há pouco tempo e a figura dela é impossível de sair da minha memória.

Não pude me conter ao contentamento de manifestar-lhe comovido a minha emoção em ler seu soneto de sábado último, 27/11, na página de poesia. Formidável!

Que o Senhor Jesus lhe cubra de bênçãos no novo século, que inicia no próximo mês.

De seu leitor,

Fernando”.

O poeta, depois da surpresa, respondeu ao Sr.Fernando, agradecendo-o pelas palavras emocionantes

- que o comoveram, também.

Maurício Marzullo, advogado e poeta, nasceu na Cidade do Rio de Janeiro a 12 de setembro de 1915.

Durante toda a sua vida, trabalhou como civil no Ministério da Aeronáutica, enquanto advogava e se dedicava a escrever sonetos e crônicas para a revista de humor e sátira O Espeto, fundada em 1947, pelo seu cunhado e amigo Nestor Tangerini.

Maurício, cidadão reto e modesto, faleceu em Cabo Frio, RJ, em 17 de maio de 2008, deixando uma vasta produção poética, que ele julgava ser de pouca importância, o que não é verdade. Foi um grande poeta e seus sonetos, na grande maioria, são dedicados a amigos e familiares.

Morando no Rio ou em Cabo Frio, muitas vezes respondia a minhas correspondências com sonetos hilariantes ou graciosos. Achava sempre um mote para, dali, de algum assunto, responder-me carinhosamente com graça e poesia.

Mãe, esposa, filhos, netos, bisnetos, irmãs, sobrinhos e amigos, sempre ganharam de presente um soneto de sua lavra.

Unia o presente ao passado, e escreveu sonetos para a avó paterna, Concetta Mannarino, e para o avô paterno, Manuel Gomes Soares, quando estes partiram.

Para o sobrinho que vos escreve, num momento em que este andava descrente, desanimado e casmurro, Maurício produziu este soneto mágico e encantador, escrito em Barra de São João, RJ, terra do poeta Casimiro de Abreu, em 5 de dezembro de 1999:

“NUNCA PERCA!

Ao meu sobrinho Nelson Marzullo Tangerini

Nelsinho, recebi o seu postal

e os sonetos também do Tangerini.

e assim não fosse, logo, logo “in-limine”,

tê-los-ia pedido, por sinal.

Não se deixa morrer o que nos “val”,

o que de bom o pensamento exprime;

tampouco o nosso enlevo virginal,

por isto é o que nos salva e até redime.

Quadras, sonetos, contos, anedotas

irão ao ar aqui, por estas plagas,

tão logo o azado instante se ofereça.

E, então, até sisudos ou janotas,

contentes, chutarão todas as pragas,

afim de que o que é bom nunca pereça!

Sou um homem feliz: meu pai e meu tio eram poetas. E dos bons. A literatura entrou em minha alma graças à sensibilidade desses dois grandes homens. E de duas mulheres: minha avó, Antônia, e minha mãe, Dinah, simples leitoras, que amavam literatura e tinham o costume de cantar e recitar poesias.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 13/12/2020
Código do texto: T7134251
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