BEBEL E LUÍZA
Aos quarenta anos, descobriu-se grávida e teve a filha com a qual sempre sonhara... Nasceu sua Luíza... sua felicidade. Voltava do trabalho saudosa e contente, para o seu pedacinho de gente... A cada passo que Luíza dava, o mundo de Bebel se iluminava... sua vida florescia. A cada palavra que Luíza aprendia, a mãe aprendia uma diferente emoção. Pena que não podia pausar sua vida para acompanhar, mais de perto, os progressos de sua bebê, suas pequenas conquistas que eram também dela e lhe traziam alegria... tinha que trabalhar duro para pagar as contas e manter sua cria.
Aos vinte anos, Luiza saía, como toda jovem da sua idade, mas era responsável, não dando preocupações maiores para a mãe; aos trinta já tinha tido relacionamentos que não duraram muito, mas sua prioridade era Bebel. Tinha um emprego seguro que lhe permitia dar pequenos luxos à mãe, um plano de saúde decente, e a tranquilidade de saber que era amada e que seria bem cuidada sempre.
Por volta dos setenta, Bebel, ainda forte e bem disposta, se aposentou e pode descansar da lida pesada que enfrentara até então, para desfrutar a vida com a tranquilidade de não ter que cumprir horários e poder descansar. Cozinhava e arrumava a pequena casa, esperando sua filha querida chegar do trabalho. Aos oitenta, ainda fazia companhia a Luíza, então com quarenta anos que, ao contrário de sua mãe, não tivera filhos, nem se casara, mas tinha muitos amigos e, para onde ia, levava a mãe, sempre animada para passear.
Aos noventa, a senilidade começou a tomar conta de Bebel, que foi acometida de lapsos de memória, perda de suas habilidades de excelente cozinheira, e teve sua mobilidade comprometida, o que, por fim, a levou a tornar-se totalmente dependente de Luíza que, na faixa dos sessenta anos, decidiu se aposentar para cuidar da mãe.
Aos cem anos, Bebel virou a bebê de Luíza, que passou a cozinhar e liquidificar a comidinha de sua mãe, administrada na mamadeira, a dar-lhe papinhas, banho e trocar-lhe as fraldas, tudo isso com muita dedicação, carinho e amor.
No dia 4 de dezembro de 2020, depois de viver 106 anos, Bebel descansou. Luíza chorou muito, e ainda vai chorar bastante de saudades, mas terá sempre a certeza de que cuidou muito bem de sua mãezinha, e de que por ela tudo fez. Talvez agora, aos 66, ela se permita viver mais intensamente, e realizar alguns sonhos que, sem lamentar-se, teve que adiar, mas ainda é cedo para fazer planos... o tempo dirá...
Como Luíza costuma me dizer, estamos apenas jovens há mais tempo... diz também que a vida começa aos sessenta... Acho que ela tem razão, por que não?
*Dedico esta singela crônica a minhas queridas amigas Bebel e Luíza*
Ouvindo Christina Aguilera - Hurt - Legendado - português/inglês
https://youtu.be/fGCdEHHfoWE