Viagem cotidiana

Estou parado no ponto de ônibus. Fecho meus olhos. Neste momento, desejo fortemente a não existência. Todas as células do meu corpo querem isto, minha alma quer isto, eu quero isto. Desejo fortemente como se fosse uma oração para o nada.

Abro meus olhos. Ainda estou no ponto de ônibus. Existindo da mesma forma que a mulher segurando o cachorro ao meu lado. Quer dizer, não dá mesma forma, vai saber o que ela está sentindo, pensando ou amando. Meu Deus, como eu queria ser ela. Na verdade, eu queria ser qualquer um, menos eu, neste instantemente momento.

Estou entediado, penso em pegar um cigarro em bolso para fumar. Pego ou não pego? Eis a questão… Será mais nobre...ah droga, esqueci o resto. Não importa. Aonde eu estava mesmo? Ah, é mesmo, o cigarro. Talvez eu deveria deixar de fumar. Aquelas imagens na carteira me assustam um pouco. Morte, não é? Se bem que eu chegarei lá querendo ou não. Enfim, voltando ao cigarro, procuro em meu bolso. Acho um maço. Coloco meus dedos na tentativa de reti – ah, droga! Lá vem o ônibus. Bem, pelo menos ele chegou.

Subo no ônibus, pago o dinheiro e vou me sentar no banco. Droga, agora eu estou com vontade de um cigarro. Tenho que controlar meus desejos, a civilização é isto, Freud já dizia. Por falar nele, ele gostava de fumar, não? Charutos… Nunca fumei charutos, mas sempre os imagino com algum gosto adocicado, não sei.

Olho para a janela do ônibus. Fico nauseado. Não uma nausea da existência, mas sim uma náusea normal mesmo. Normal? Uma náusea existencial pode muito bem ser o meu normal. De qualquer maneira, estou totalmente enjoado. Estou suando, as pessoas me parecem aglomeradas. Isso, grandes aglomerações de faces sem personalidade. Será que estão nauseadas como eu? Claro que não, não são tão doentes. Tento aguentar, seguro a náusea assim como seguro minha vontade de expelir fumaça por toda a condução.

O ônibus está chegando em meu ponto. Estou aliviado. Aliviado e com náuseas. Desço o mais rápido que posso do ônibus. Seguro em uma parede. Não há descanso. Uma súbita vontade de nada sobe por toda a minha garganta derramando um niilismo pegajoso sobre a rua empoeirada. Fico aliviado. Acabou (por hoje, eu acho).