Planejamento

Um alvoroço. Todos falavam ao mesmo tempo. O tema era por demais interessante: O planejamento escolar.
Perguntava-lhes: - Por que planejar?
Pausa. Um silêncio incômodo. Cabeça baixa resmunga e comentários paralelos aliados às expressões de desagrado. Retomamos com a questão que levara às mais diferentes reações. Planejamento escolar. Nesse trajeto discursivo ouvi interessantes indagações e extremadas posições:

-Nós só vamos para as chamadas reuniões de planejamento porque é o jeito. Não seria necessário o dia todo para copiar o plano, pois já tenho muito tempo de trabalho como professora.-
- Menina, às vezes eu telefono e eu tomo conhecimento da reunião...É sempre é a mesma coisa. A coordenadora pedagógica não diz nada, só reclama! Às vezes, traz tudo pronto para executarmos...
Interessante, na minha escola nós discutimos em conjunto e elaborarmos nossas atividades. Acredite com a elaboração do projeto pedagógico a gente aprendeu a trabalhar junto.
O diretor fez um convênio com uma consultoria de São Paulo, mas, nós [professores só executamos o planejamento que eles apresentam e deixam claro nosso papel: Tem ser como eles disseram.... Ah! Eu desaprendi, é tanta novidade mal contada que eu não sei por onde começar. Puxa vida, um processo que eu só executo. Gostaria de criar novas situações de aprendizagem.
Os treinamentos são rápidos e nós temos que nos virar. Não sei como vou trabalhar em ciclos se não sei nem o que realmente significa. Como vou planejar o que eu não sei fazer? Eles são ótimos para cobrar, mas péssimos para orientar.
Tais falas expressavam diferentes sentimentos.

Refletimos sobre então sobre eles. A reflexão nos levou a discutir sobre Política Educacional, a Lei de Diretrizes e Bases- LDB, os Parâmetros Curriculares- PCNS, as Diretrizes Curriculares, os encontros nacionais, o provão das universidades, o ENEN, os Institutos Superiores de Educação, a reforma do curso de Pedagogia, as novas competências profissionais na área de educação, as novas exigências com relação ao professor, a corrida desenfreada de professores em busca da titulação em nível superior pressionados pela exigência legal e pela necessidade premente de qualificação profissional

Nos perguntamos? O que esse contexto atual tem gerado? Conflitos? Desconfortos? Satisfação?
Assim fomos percorrendo um trajeto discursivo estimulados a aprofundar estudos em torno desta temática.
Questionava com eles:
Perguntava: - Como traduzir no cotidiano da sala de aula a presença destas amplas questões? Como entender que tais reflexões fazem parte, não só de um grande jogo de interesse ideológicos, políticos, sociais e que não são apenas de âmbito nacional, regional, estadual e ou municipal, mas reflete um mundo globalizado, capitalista, que vem determinando os rumos da educação brasileira? Em que as regras da mundialização da economia, do avanço do neo-- liberalismo tem contribuído para a mudança de paradigmas econômicos, sociais, culturais e educacionais? Qual a relação do tema com essas questões amplas? Qual o seu tamanho?
Nesse cenário de debates, inseri elementos conceituais sobre planejamento, seus pressupostos teóricos, metodológicos, políticos, econômicos e históricos. Retomamos tais questões resgatando um olhar dialético
Ratifiquei que planejar não significa tão somente antever uma ação, sistematizar tarefas, organizar atividades do tempo, definir conteúdos e selecionar objetivos numa linguagem predominantemente instrumental, acrítica, retratando um fazer estático, burocrático e alienado desvinculado de uma visão mais ampla do processo educativo
Mergulhada nessas reflexões, dei-me conta de que poderia adequar a experiência de Jussara Hoffman sobre avaliação e resolvi investigar as representações sociais que os alunos tinham sobre processo de planejamento. E comecei a investida na esperança que minha aventura pedagógica nos conduzisse a um caminho de revelações e reflexão.
1. Etapa:
Solicitei que mostrassem, através do desenho, o que sentiam sobre o planejamento escolar. Assim o fizeram.
No segundo momento extrapolei a experiência anterior e arrisquei continuar o processo de reflexão. Criei outra etapa
2. Etapa:
Orientei que cada uma escrevesse as dúvidas, as expectativas, as experiências que tinham com o planejamento escolar recomendando que não se preocupassem com a forma, mas sim com as idéias, sem censuras. Era uma espécie de tempestade mental escrita e individual.
3. Etapa:
Terminada a tarefa, mais uma vez fiz uma solicitação, só que desta feita, pedi que cada um tentasse reorganizar o texto de forma estruturada. Alguns sussurros em sala, algumas manifestações de cansaço, outras de resistência alegando dificuldades em escrever.
Enfim, terminada a tarefa, recebi o material e disse que no dia seguinte traria para discutir em sala.
Em casa comecei a analisar o material: desenhos de:
Balança, régua, estrada, cadeira quebrada, relógio, nuvem passageira (diz a professora no desenho) um símbolo do nazismo, desenho de uma fábrica, um dedo apontando para uma figura humana de joelho, espirais, estrada com sol ao final, túnel com porta aberta ao final, portas abertas de um lado e fechada do outros, grupos de pessoas em círculo com a presença de uma pessoa coordenando, grupo de professores no mesmo plano, arvores, mesa posta, espadas em luta (escrita- uma batalha cotidiana), pontos de interrogação, Pontos de exclamação, plantas de casa, e muitas outras...

Processando a análise dos desenhos encontrei (sob minha ótica é claro) diferentes sentimentos:
Medo, abertura, resistência, rotina, desesperança, descrédito, submissão, dúvida, crença, entusiasmo, desencanto, alegria, amargura, revolta,
Nessa leitura analítica constatei 70% dos desenhos refletiam sentimentos negativos e somente 30% expressavam forte dose de otimismo.
Logo em seguida fui ler os textos produzidos pelos alunos e verifiquei que seus escritos eram coerentes com os sentimentos retratados nos desenhos. O mais interessante é que ao processar uma análise de conteúdo da produção escrita verifiquei que 90% das produções refletiam um mal-estar visível principalmente destacando, segundo eles, as enfadonhas reuniões de planejamento. Tal expressão foi uma das mais recorrentes nos trabalhos escritos.
De posse dessa análise, no outro dia, iniciei com os alunos uma reflexão sobre o material, destacando a análise feita. Foi um sucesso! Na verdade, o debate possibilitou a revisão sobre os conceitos apreendidos ao longo da prática pedagógica massacrada por modelos tradicionais e tecnicistas, onde o professor teria que ser um profissional de conteúdos e ou um técnico, longe de ser um educador com as competências necessárias ao desenvolvimento de seu trabalho pedagógico.
Ah! Tem mais! Decidimos aprofundar o tema, ler os autores que discutem essa questão e, sobretudo relacionar com outros saberes numa tentativa de reconhecer a interdisciplinaridade do conhecimento.
Concluímos evidenciando a importância e a necessidade de ressignificar a prática de planejamento nas escolas reconhecendo que é essencial a construção de novos saberes e de novas práticas pedagógicas.





 
Regina Barros Leal
Enviado por Regina Barros Leal em 01/12/2020
Código do texto: T7125118
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