Carente de sol
Vou ao médico e volto com algumas receitas motivadoras, além de múltiplos exames. Todos eles devem ser feitos em jejum.
O laboratório suga meu sangue em quatro tentativas. A primeira agulhada penetra meu braço e suga apenas um pouquinho de sangue porque entope a seringa. De modo que as veias de que me ocupo detestam serem chuchadas e sorvidas, se escondendo da ofensiva com grande facilidade.
Nova tentativa e nada de sangue jorrando. A sugadora revela que isso nunca tinha lhe ocorrido, depois decide que havia me atendido outras vezes, sem mais problemas. Estranha forma de cobrir o fracasso das picadas. Acrescentou que meu sangue estava espesso e que devia beber mais água durante o dia.
Troquei de braço e a terceira picada foi em vão. Não chupou meu plasma proletário para dentro do aparelho. Deve ser o material, protestei categórico, de má qualidade. Hoje em dia falsificam turbina de avião. Ela disse que desconhecia qualquer possibilidade disso ocorrer no sistema público de saúde. Utilizava aquele material na clínica há vinte anos. Essa medida de tempo é sempre utilizada para subterfúgio.
Minha vontade expressa era perguntar se trabalhava no ramo há bastante tempo. Prudente evitar qualquer pressão, pois, recairia sobre mim cada nova investida. Em posição de vencer ela quem estava, com aquela agulha pontiaguda, insistindo em meu braço como touro nas touradas. Ela se preparava com fúria para a quarta picada, apontando de longe a ponta crua e funda contra minha veiazinha solícita e desmoralizada. Acertou! O sangue jorrou para dentro da seringa com vontade.
Alguns dias mais e saberia os resultados.
Um exame revelou que estou carente de sol e largos sorrisos.