Quem me conhece sabe: não gosto de futebol.
O futebol não mexe com as minhas emoções, muito menos com os meus nervos. Não faço questão nem de assistir à Copa do Mundo. Mas sou atraído por algumas personalidades deste esporte. Maradona foi uma destas.
A primeira vez que dele ouvi falar foi na final da Copa de 1986. Eu estava na casa do meu tio Antônio e assistimos ao jogo entre a Argentina e a Alemanha. Todos vibrando pela atuação do craque argentino durante a competição. Família reunida: tio Antônio, tia Dodora, meu primo Warlem e as minhas primas Érika e Elke. Talvez havia mais alguém, mas não me lembro. Eu ainda estava para completar dez anos e tive então a primeira noção do que significava uma final de copa do mundo na vida das pessoas.
Lembro que naquela ocasião eu vibrei muito com o título da Argentina. Se dependesse daquele dia, eu seria um torcedor apaixonado pelo futebol. Talvez eu possa culpar a educação protestante que eu recebia em casa, que na época abominava qualquer que fosse o esporte, pelo meu desprezo pela bola. É evidente que a religião teve lá a sua parcela nas minhas preferências, mas não foi a única culpada. Nas poucas vezes em que experimentei entrar em campo, o meu desempenho era tão pífio, que eu era logo retirado para a reserva. Então eu ficava ali assistindo. Quem assiste, sabendo que assiste porque é ruim, acaba por achar que assistir é chato. Portanto nem de assistir consegui gostar.
No entanto eu sempre acompanhei as notícias de bastidores. Gosto de especular sobre a gestão dos clubes, as carreiras de alguns atletas e como estes as conduzem junto aos seus empresários, as estratégias que usam para cair nas graças da mídia, conquistar admiradores e, consequentemente, aumentar o já polpudo faturamento através da venda de produtos.
E é aí que personagens controversos, polêmicos e muito reais, ganham a minha atenção. Tenho uma queda pelo anti-herói.
Acho interessante o cara que, mesmo tendo acesso a um aparato de profissionais para cuidar da sua imagem, que, tendo o poder de “fabricar” a impressão que quer passar aos seus admiradores e, apesar disto, vive à própria maneira, com todas as suas contradições e falhas, mesmo que isto custe um preço muito alto. Talvez esta não seja uma escolha do indivíduo, mas uma incapacidade de se segurar na existência.
Maradona conseguiu ir do céu ao inferno sem tentar se disfarçar enquanto equilibrava um holograma nas alturas. Esteve no alto enquanto conseguiu se manter lá e caiu. Não voltou ao estrelato, não porque lhe faltasse vontade, mas porque não teve forças para se reerguer. Então se manteve aqui, no chão da realidade, do jeito que dava, ou do jeito que pensava que dava.
Neste chão Maradona não procurou esconder suas quedas, tentava se recuperar. Muitas vezes falava mais do que devia, se metia em polêmicas e, com a mesma ferocidade com que arranjava confusão, também escancarava o sorriso e celebrava o bom gosto de viver.
Maradona não tentou ser politicamente correto e, se tentasse, seria um fracasso. Não procurou ser um bom exemplo fora dos campos. Muito pelo contrário. Foi ele mesmo, com a crueza de carne, sangue e terra. Com bons e maus momentos. Usufruindo os bons e pagando caro pelos maus.
E mesmo que não procurasse ser espelho, sua alma também refletia o melhor do ser humano na luta por justiça, na defesa das bandeiras nas quais acreditava, ao se posicionar politicamente e na luta pelo social. Não conseguia ficar em cima do muro. Diego foi um ser humano de muita fibra.
Viveu. Arrastou a carcaça até que o coração, já cansado de tantos excessos, parou. Num dia de semana qualquer. Em tempos de pandemia. A um mês do Natal.
Aos sessenta, entrou para a história. Deixou um legado. Um ícone a ser observado pelos garotos que um dia sonham em ser um jogador. Um ser humano a servir de exemplo de como os excessos podem matar o corpo.
É triste o dia. Mas o maior mal que fez, ele o fez para si mesmo enquanto aqui viveu. Resta-nos lembrar do craque.
Que o Eterno o receba e lhe proporcione o merecido descanso do desassossego desta vida.
(Imagem: Google)
O futebol não mexe com as minhas emoções, muito menos com os meus nervos. Não faço questão nem de assistir à Copa do Mundo. Mas sou atraído por algumas personalidades deste esporte. Maradona foi uma destas.
A primeira vez que dele ouvi falar foi na final da Copa de 1986. Eu estava na casa do meu tio Antônio e assistimos ao jogo entre a Argentina e a Alemanha. Todos vibrando pela atuação do craque argentino durante a competição. Família reunida: tio Antônio, tia Dodora, meu primo Warlem e as minhas primas Érika e Elke. Talvez havia mais alguém, mas não me lembro. Eu ainda estava para completar dez anos e tive então a primeira noção do que significava uma final de copa do mundo na vida das pessoas.
Lembro que naquela ocasião eu vibrei muito com o título da Argentina. Se dependesse daquele dia, eu seria um torcedor apaixonado pelo futebol. Talvez eu possa culpar a educação protestante que eu recebia em casa, que na época abominava qualquer que fosse o esporte, pelo meu desprezo pela bola. É evidente que a religião teve lá a sua parcela nas minhas preferências, mas não foi a única culpada. Nas poucas vezes em que experimentei entrar em campo, o meu desempenho era tão pífio, que eu era logo retirado para a reserva. Então eu ficava ali assistindo. Quem assiste, sabendo que assiste porque é ruim, acaba por achar que assistir é chato. Portanto nem de assistir consegui gostar.
No entanto eu sempre acompanhei as notícias de bastidores. Gosto de especular sobre a gestão dos clubes, as carreiras de alguns atletas e como estes as conduzem junto aos seus empresários, as estratégias que usam para cair nas graças da mídia, conquistar admiradores e, consequentemente, aumentar o já polpudo faturamento através da venda de produtos.
E é aí que personagens controversos, polêmicos e muito reais, ganham a minha atenção. Tenho uma queda pelo anti-herói.
Acho interessante o cara que, mesmo tendo acesso a um aparato de profissionais para cuidar da sua imagem, que, tendo o poder de “fabricar” a impressão que quer passar aos seus admiradores e, apesar disto, vive à própria maneira, com todas as suas contradições e falhas, mesmo que isto custe um preço muito alto. Talvez esta não seja uma escolha do indivíduo, mas uma incapacidade de se segurar na existência.
Maradona conseguiu ir do céu ao inferno sem tentar se disfarçar enquanto equilibrava um holograma nas alturas. Esteve no alto enquanto conseguiu se manter lá e caiu. Não voltou ao estrelato, não porque lhe faltasse vontade, mas porque não teve forças para se reerguer. Então se manteve aqui, no chão da realidade, do jeito que dava, ou do jeito que pensava que dava.
Neste chão Maradona não procurou esconder suas quedas, tentava se recuperar. Muitas vezes falava mais do que devia, se metia em polêmicas e, com a mesma ferocidade com que arranjava confusão, também escancarava o sorriso e celebrava o bom gosto de viver.
Maradona não tentou ser politicamente correto e, se tentasse, seria um fracasso. Não procurou ser um bom exemplo fora dos campos. Muito pelo contrário. Foi ele mesmo, com a crueza de carne, sangue e terra. Com bons e maus momentos. Usufruindo os bons e pagando caro pelos maus.
E mesmo que não procurasse ser espelho, sua alma também refletia o melhor do ser humano na luta por justiça, na defesa das bandeiras nas quais acreditava, ao se posicionar politicamente e na luta pelo social. Não conseguia ficar em cima do muro. Diego foi um ser humano de muita fibra.
Viveu. Arrastou a carcaça até que o coração, já cansado de tantos excessos, parou. Num dia de semana qualquer. Em tempos de pandemia. A um mês do Natal.
Aos sessenta, entrou para a história. Deixou um legado. Um ícone a ser observado pelos garotos que um dia sonham em ser um jogador. Um ser humano a servir de exemplo de como os excessos podem matar o corpo.
É triste o dia. Mas o maior mal que fez, ele o fez para si mesmo enquanto aqui viveu. Resta-nos lembrar do craque.
Que o Eterno o receba e lhe proporcione o merecido descanso do desassossego desta vida.
(Imagem: Google)