Contrato, aliança e natureza: nossa relação com Deus

Immanuel Kant defendia que a relação contratual é típica do homem civilizado. Para ele, contrato é a aceitação de condições sociais que permitem o relacionamento entre as pessoas, de modo que os objetivos mútuos sejam alcançados. Em um contrato, podem-se identificar as partes interessadas, as cláusulas ou termos, o mecanismo rescisório e as sanções a serem aplicadas à parte distratante. Para Kant, a relação contratual consiste em um processo civilizatório, precedido pelo estado natural, onde as relações são predatórias não consensuais e sucedido pelo estado de direito, onde as partes são mediadas por normas de aceitação comum ou impostas por um ente que representa o interesse coletivo, o Estado.

Diferente do contrato, a aliança extrapola a busca de objetivos específicos. Partes aliançadas interagem em nível de substância, de forma que rompem a dualidade das partes em benefício de uma unidade essencial. Paulo explica aos Efésios que a união entre o salvo e Cristo é semelhante à união entre o noivo e a noiva, que abdicam da pessoalidade para se tornarem uma só substância. Jesus usa metáforas como a videira e os ramos para apresentar o mesmo conceito. No contrato, há uma relação harmoniosa mediada por termos consensuados entre as partes, na aliança há uma fusão das partes, de modo que não é necessário negociar termos, uma vez que eles se integram à essência dos aliançados, que vivem e pensam de forma igual.

Talvez isso explique o rompimento da letra e a apresentação dos princípios, que Jesus estabeleceu ao ressignificar a Lei. Na verdade, Deus sempre buscou a aliança, mas a humanidade limitou-se a uma relação contratual, até que o próprio Deus fundiu-se ao homem, fazendo com ele uma só carne no corpo e no sangue de Cristo. Tornou-se assim possível a aliança, na perfeição proporcionada pelo Deus encarnado. Feito isso, a letra tornou-se morta, pois não é mais necessária. O homem pecador rompeu os termos contratuais, mas o eleito em Cristo não é capaz de romper com a aliança, uma vez que ela não se limita a termos, está escrita nos corações, incorporada a nossa essência.