A LIÇÃO DAS PLANTAS
A LIÇÃO DAS PLANTAS
Nelson Marzullo Tangerini
Affonso Romano de Sant´Anna, certa vez, escreveu “Que presente de dar?”, crônica que ecoa até hoje em minh´alma, arborizada de literatura.
Gosto de ser presenteado com livros bem escritos e engenhosos e plantas.
Há uma sintonia perfeita entre mim e D. Nicoletta Marzullo, minha sogra, com quem dialogo sobre ervas medicinais, flores e árvores.
Um dia desses, ganhei dela um pé de amora, amoreira; a fruta que me faz lembrar da infância no quintal de minha casa, em Piedade, quando vivia a subir na árvore para catar a fruta.
A minha amoreira morreu, como todos os seres morrem. Tentei plantar outras amoreiras no mesmo quintal, mas não vingaram e vieram a morrer.
Pois há dias ganhei uma amoreira de D. Nicoletta. Levei-a de Irajá para Piedade, onde a plantei, sabendo que uma chuva viria para ambientá-la ao novo solo.
A amora é uma de minhas frutas prediletas, ao lado da banana – como um bom primata -, da pitanga, da maçã, da tangerina e da laranja.
Criado em quintal, plantando árvores, passei a respeitá-las religiosamente, uma vez que nos dão sombra, flores, frutos e inspiração para romances, biografias, crônicas e poesias.
O soneto “A lição das palavras”, que Paulo Nunes escreveu para seu filho, Paulino, retrata bem o que uma árvore representa para todos nós:
“Não maltrates as árvores! Mas, antes,
trata-as, meu filho, sempre com carinhos...
- Olha como dão sombra aos caminhantes,
abrindo os braços verdes nos caminhos...
Da erva rasteira aos vegetais gigantes
- as plantas... dão mais flores do que espinhos –
garantem a vida aos nossos semelhantes
e os pássaros abrigam com seus ninhos...
De uma erva foi feita aquela cama
em que nasceste... e o berço, e o banco, e a mesa,
e o teto em que habitamos...
E a roupa, e o livro, e a lenha que se inflama...
e, como última prova de grandeza,
dão-nos nosso caixão, quando nos vamos!...”
Nunca mais soube de Paulo Nunes, poeta goianiense, que, volta e meia, me enviava seus sonetos ecológicos.
Arrumando minha casa, em Piedade, eis que encontro o poema acima.
Nicoletta não é poeta, é simples leitora, fã do poeta Castro Alves e do escritor Machado de Assis, mas o amor com que trata suas plantas, em seu vasto quintal, revela que tem a poesia na alma.
O presente foi plantado no coração do cronista, que batizou a árvore com o seu nome.