UMA BANDA MADE IN BRAZIL

MADE IN BRAZIL

Nelson Marzullo Tangerini

Desafiando os puristas, Oswaldo Vecchionne vem liderando, há anos, uma das melhores e maiores bandas do rock brasileiro: o Made in Brazil, que sempre, em seus shows, onde quer que toque, se apresenta com as bandeiras do Estado de São Paulo e do Corinthians.

Puristas, para essa gente, é um elogio, uma vez que essas pessoas têm se revelado, literalmente, como nacionalistas furibundos.

Quem conhece a Paulicea Desvairada, sabe muito bem que a referida megalópole, a maior da América do Sul, é uma miscelânea de raças de todo o mundo. Daí chamarem Pompeia de Liverpool paulista e a esquina das avenidas São João com Ipiranga de “esquina do mundo”.

Caetano Veloso, autor de Sampa, disse, certa vez, que não havia nada mais americano do que o estilo de vida do paulista. E eu o corrigiria: “do paulistano”.

Sobre os puristas, me vêm à mente frases históricas de Gilberto Gil, ex-Ministro da Cultura no Governo Lula, de que “raiz é mandioca de rabanete”, e de Rita Lee, legendária personalidade Mutante, que, taxativa e demolidora, em canção, com musicalidade sertaneja, nos lembra de que “Futebol é gringo como o rock’n’roll”, esse esporte “nacional” que chegou ao Brasil pelos pés dos ingleses.

O poeta Oswald de Andrade, no Manifesto Antropofágico, sustentava que podíamos deglutir a cultura estrangeira e fazer a nossa própria cultura.

Soa um tanto “integralista”, pensar numa cultura pura e genuinamente brasileira. Deixemos esses verdes antúrios se masturbarem sob o símbolo do “sigma”.

O Made era a banda preferida do nosso saudoso e querido Zeca Jagger, o hilariante crítico musical Ezequiel Neves, que, com seu humor inteligente, deixou crônicas memoráveis, publicadas na Revista POP, no Jornal da Tarde, de São Paulo, e no Jornal de Música. Alguém, um memorialista sem preconceitos, podia reunir todos esses valiosos trabalhos em livro, em homenagem ao grande Ezequiel Neves.

Para Oswaldo Vecchione, escrevi, certa vez, um link musical - mais precisamente para a sua banda, com o título MADE IN BRAZIL: “Eu lia em todos os cantos,/ eu lia em todos os lados:/ Made in Brazil, Made in Brazil.../ E tudo o que era digno de exportação me alertava: / Made in Brazil, Made in Brazil...”

Escrevi para Oswaldo, mas não recebi comentário algum por parte do músico e compositor. Mas nossa amizade continuou, bem como as trocas de correspondências. Cheguei a enviar-lhe uma fita, contendo algumas músicas minhas, que poderiam ser mexidas por ele. Mas fiquei sem resposta alguma. Talvez não tivesse gostado do que eu havia escrito.

A letra de Made in Brazil foi publicada como poesia em meu livro “Paulicea (Ainda) Desvairada, Produção Independente, de 1981.

O livro, irreverente e antissintático, foi dedicado a amigos e personalidades paulistas como Nestor Tangerini, Oswaldo Vecchionne, Guilherme Arantes, Rita Lee, entre tantos outros nomes significativos da vida cultural paulista. E, é lógico, ao modernista Mário de Andrade, poeta, pesquisador e musicólogo, autor de Paulicea Desvairada.

Oswaldo é um herói na resistência: na luta contra o fascismo e na crença de que o rock brasileiro existe e tem nome.

Durante um bom tempo, uma intelectualidade obtusa, sisuda e nacionalista, sustentava a tese de que o rock era alienação, enquanto outros o deixariam para as matinês. Se a Bossa Nova era samba com musicalidade jazzística, ou seja, americana, por que não se podia tocar rock no Brasil? Esse tal de roquemrou se espalhou pelo Planeta inteiro e, tenho certeza, durará mais que a covid 19.

O rock, segundo o Rolling Stone Mick Jagger, foi a forma mais santa que a juventude encontrou para desobedecer ao estabelecido. E isto foi comprovado em shows e protestos contra a Guerra do Vietnã, no final da década de 1960. E, depois, com “Do they know it´s xmas time” e “USA for Africa”, entre outros shows.

O rock, apesar de suas dores reumáticas, ainda é o velho revolucionário que impulsiona todas as nossas revoltas contra o autoritarismo. Ele derruba muros e leva a solidariedade aos excluídos do mundo.

Hoje, Oswaldo é um amigo de Face e venho acompanhando sua luta incansável para manter viva a chama do rock´n´roll e da democracia.

Vida longa, velho companheiro Oswaldo Vecchionne!

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 08/11/2020
Reeditado em 08/11/2020
Código do texto: T7106813
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