Esperança

A priori pensei que era esperança aquele vislumbre verde à minha frente. Era? Quem dera fosse...

Era a minha desesperança no futuro, flertando a figura funesta da foice

Foi o meu olhar abismado, absorto, aturdido, aflito, absorvido nos coices da vida...

Olhando melhor, era um...

louva-deus, parado, altivo, perto da avenida

Indiferente às pisadas pesadas das pessoas que passavam apressadas na pista

Que pareciam estar sempre atrasadas para alguma entrevista ou coisa parecida...

Muitas delas, preocupadas com o pecado, carregavam a Palavra de Deus no suvaco

Enquanto outras, mais despreocupadas, grudavam a cara nos smartphones caros

E eu, sem escrituras nem celulares, fitava a estranha criatura postada no caminho

De vez em quando eu até alertava: "ei!, camarada, cuidado pra não esmagar o bichinho!"

Por sorte ou providência divina, ninguém pisou no pobre diabo...

Intrigado, pois, com tal criatura estática, saí da minha habitual inércia,

E fui acudi-la, na atitude louvável de salvaguardar seu corpo delgado

Das solas dos sapatos solitários das pessoas apressadas e sérias...

Eu disse que era um louva-deus? Quimera! Era a maldita miopia!

Oh, perdoem-me! Eu jurava que fosse... Me enganei novamente.

Quando cheguei perto, constatei que era só uma folhinha...

Verdinha, viva, entranhada numa fissura feita por alguma semente,

Que por milagre rompia o cimento e dava à luz uma plantinha...

Ah, espera: eu disse que era só uma planta?

Bendita epifania...

Louvada seja de… a poesia!

Que à revelia do concreto revelou a insurgente esperança,

Emergindo da terra em meio ao caos,

Em volta dos cinzentos arranha-céus...