Jaspion
Robério é o seu nome de batismo
Mas é conhecido mesmo pelo seu apelido:
Jaspion - por viver imitando o personagem fictício
...de um famoso seriado
É um homem de semblante abatido, muito, mas muito magro
Além disso, tem vício em álcool - todo santo dia é fácil senti-lo embriagado...
Enfim, entrei na taverna com meus amigos
E lá estava Jaspion, a um canto do recinto,
Conversando consigo mesmo, recolhido;
Espiando-nos, lançando olhares tímidos,
Quiçá de tristeza, em direção à nossa mesa, cheia de bebidas e petiscos,
Como se se esperasse, da minha parte, um convite ou algo do tipo
Depois de uns dois tragos,
Levantei-me, enchi de Pitú um copo descartável,
Parti um pedaço de guizado, botei num prato de plástico,
E fui em sua direção, entregá-lo
Ele agradeceu de imediato
"Muito obrigado!", disse, apertando minha mão com muito entusiamo
"Não há de quê" respondi, meio acanhado
E ele, pude sentir, quando sentei, ficou um tanto emocionado
Talvez por ter sido tratado bem por uma pessoa que nunca o tinha notado
Porque na realidade, ele já deve estar acostumado a ser rejeitado
A ser desprezado, até mesmo hostilizado
É que, infelizmente, a gente não se importa com os humilhados -
Esses que vivem nas portas dos bares procurando sentir-se menos solitários
Dali a pouco, um amigo nosso, que já conhecia Jaspion há tempos,
Levantou-se da mesa e foi ter com ele
Ouvi o diálogo:
"Ei Jaspi, como é o golpe do Grande Guerreiro de Daileon? Dale aí pra os cara ali vê..."
E assim ele o fez, o que achei muito engraçado e divertido...
Acontece que o cara retirou o celular do bolso, colocou um episódio do famoso seriado e deixou com Robério, ao passo que este ficou muito maravilhado!
Ficou tão vidrado no episódio, que esqueceu até do quartinho de destilado ao seu lado...
Ele assistia o seriado com seriedade, com amor e verdade, com uma saudade inexplicável, muito profunda, de sua juventude, imagino...
E foi lindo observar essa cena - ele quase não piscava os olhos de tão compenetrado!
Quando o episódio terminou, pude notar seus olhos embebidos de lágrimas... Nostalgia, saudosismo mexe mesmo com a gente. Enfim ele entregou o celular do cara, levantou-se lentamente e foi embora... Não sei o que ele sentiu, se uma rasa tristeza ou uma alegria rara - só sei que meu peito ficou ilhado...
E ouvia os outros dizerem:
"Caralho, galera, Jaspion nem tocou na cachaça!"
E todos corroboravam com afirmações parecidas com estas. Fato é que Jaspion é alcoólatra. Um fatídico fato, meus caros. O quartinho de cana ficou lá, irretocável. E eu fiquei pensando, cá no meu quarto, sobre o encanto e o desencanto desse caso...
Talvez o ato heróico de Jaspion fosse derrotar o seu arqui inimigo: o alcoolismo.
Perdi o sono, no entanto ganhei o canto do galo.