CRÔNICAS DA PRAÇA ROOSEVELT II

BOA NOITE SEU MÁRIO II

Acerca do texto “Boa noite seu Mário e Resposta” algumas pessoas questionaram o porquê do “maldito formalismo do boa noite” e também sobre o Mário Bortolotto.

Sobre o formalismo, quis dizer que, para aquele momento, fui muito solene, muito formal e o Mário, não obstante ser uma pessoa culta, educada, no dia a dia, em praça pública, não está nem aí com a solenidade. Sua formação é de ator, é diretor de teatro, escritor, músico, dramaturgo com mais de 50 peças escritas, obras consagradas e premiadas, e pessoas desse meio são naturalmente informais. Aliás, fiquei sabendo, quem disse foi o Plínio de Arruda Sampaio, que o que o artista mais ama na vida é a liberdade.

Então seria esperar muito um boa noite como resposta àquela formalidade toda(não obstante Marião ter esclarecido que estava enviando uma msg no celular e por isso somente me cumprimentou com um meneio de cabeça), chamando o ainda de seu Mário, quando o tratamento dado por amigos e conhecidos é Mário, Marião e mesmo Bortolotto.

Além disso, é uma pessoa a quem admiro, por si, pela obra, divulgador da cultura, linguagem, arte, enfim, artista excepcional e por ter sobrevivido aos fatos ocorridos com ele em dezembro de 2009, e que é público, isto é, durante um assalto no bar dos Parlapatões, na praça Roosevelt, ao reagir à violência perpetrada contra si e seus amigos, foi vitimado com três tiros de revólver. Uma curiosidade é que ele tem um blog muito anterior a esses fatos cujo nome é “Atire no Dramaturgo”

Abaixo, um texto e um poema escritos e publicados dois dias antes do incidente que quase o matou, e neles existem uma espécie de premonição daquilo que estava por vir, confiram. Aliás, é um ótimo e bonito poema, que retrata bem o “seu Mário”.

“E falando em rapaziada que vale a pena, a Adriana Godoy lá de BH(que sempre comentou aqui e que eu conheci pessoalmente quando esteve aqui assistindo “Brutal”) escreveu um poema pra mim. Eu gostei. Fiquei lisonjeado, aliás. E gostei principalmente da parte dos anjos velando. Tô precisando disso. Ela escreveu assim:

meu querido outsider

ele vem de coturnos com os cadarços desamarrados

a camisa grande com as mangas maiores que os braços

uma camiseta por baixo

um quase sorriso e um jeito tímido e forte

o dia é feito de ressaca e de um computador

quando calor demais liga o ventilador

e as ideais se espalham em textos únicos e mágicos

a noite chega e ele sai à caça de bebida e possíveis amigos

ou joga bilhar com homens e mulheres

e não duvida que pode ter brigas e pode brigar

mas agora prefere desativar bombas

e ficar mais leve um pouco

o rock e o blues estão em suas veias

como as palavras para um poeta

a voz rouca combina tão bem com o uísque que toma

e com a música que canta

que se tornam indissolúveis

escreve como quem enxerga os subterrâneos humanos

nos seus mais obscuros infernos

e deixa a solução na alma de cada um

encena e traduz a angústia de diversos personagens

mas traz em si as angústias da humanidade

encanta por ter um coração de menino

por gostar de lutas e filme b

de revista de mulher pelada

de comer coxinha de madrugada

de ver as séries na tevê

de ouvir mp3 num canto qualquer e ficar só

de conversar com os mendigos e perdidos da cidade

enquanto estudantes estão indo pra escola

ver o sol nascer poder lhe dizer

pra voltar pra sua quitinete

e tentar dormir o que a noite não deixou

então sonha, menino, tá tudo certo

no meio do caminho pode ter um bar

e mulheres e amigos que te esperam

os anjos te velem e digam amém

(Adriana Godoy)

Valeu Adriana, que os anjos cuidem mesmo te todos nós. E que eles sejam mais bacanas que os fdp do “Supernatural”, né?

(Escrito por Mário Bortolotto às 00:42)"

Marcos Pessoa
Enviado por Marcos Pessoa em 01/11/2020
Reeditado em 04/11/2020
Código do texto: T7101849
Classificação de conteúdo: seguro