INFERNOS ENFEITADOS

Minha querida, porquê insiste em chorar calada e sozinha, tendo apenas as suas paredes como frias testemunhas de tudo aquilo que pouco a pouco foi te engolindo para dentro de um fosso escuro e doloroso...

Porquê, viveu a ilusão de uma vida que não existia, porquê achou que “bom mesmo é ser feliz sozinho”, ninguém é, enganava-te quando dizias ser o seu momento, quando falava em tom soberbo que “a vida não é feita de pares”... é sim, ninguém se encontra sozinho...

Porquê se deitava com livros que mal conseguia identificar as letras, cega por uma sensação de que o auto “encontro”, a auto “percepção” nada mais era do que um auto martírio, de noites entorpecidas por cintilantes e inofensivas taças de vinho e amanhecidas nos dissabores de ressacas que te empurravam ainda mais para baixo, ou em fotografias de dois pratos à mesa, quando era só você e um buraco parecido com o infinito...

E as músicas que te entristeciam por falarem coisas que ninguém vive mais do que em instantes.

Paga-se um preço caro pelo direito de ser frágil, de expor feridas e por ousar ser você mesma, com os miasmas interiores e os sérpicos rastejantes que batem a porta do seu último santuário... um quarto onde nada se esconde de você mesma e onde tem o direito pleno de chorar tudo... E acordar, com o desejo ativo de ser diferente e notar que tudo pode voltar a ter cores, basta se entender.