Descoberta no ônibus
A viagem de ônibus era a mesma todos os dias. No início, era um pasmo de descoberta maravilhoso. Mas sempre passava pelos mesmos lugares e isso virou rotina. E todos os amantes sabem que quando cai na rotina, quando nos acostumamos, perde a graça. Pois bem, a viagem de uma hora no ônibus perdeu a graça e apenas jogos aleatórios, como contar quantas pessoas sentadas usavam azul, mantinha a mente da jovem funcionando até ela descer no seu ponto. Às vezes, dormia. Dormir não é só para quem está cansado, pois mesmo sem sono, ela fingia e se certificava de que é possível enganar a si mesma, fechando os olhos e dormindo.
Um dia, algo fora do comum aconteceu. O ônibus foi por outro caminho e ela teve que manter-se atenta para não perder-se. Ironia: prestar atenção a um caminho desconhecido para não se perder... é claro que quem não sabe por onde anda vai se perder. Ela não conhecia os quebra-molas, não sabia onde o ônibus ia dobrar e ria com o subir e descer que fazia seu estômago revirar como se estivesse numa montanha russa. Aventurar-se pelo desconhecido era o que a fazia feliz, mesmo com medo de perder-se, o pasmo da descoberta enchia a vida de novas cores e sons.
O ônibus percorreu uma boa parte da cidade até chegar ao destino. A jovem viveu aquele dia como se nunca tivesse conhecido aquelas pessoas, como se fosse nova na terra e a surpresa da vida foi o que moveu sorrisos.
No dia seguinte, ela viu o ônibus vindo. Fez o sinal e sentiu que o ônibus curvava-se perante ela, como servo que se humilha perante o senhor. Ela entrou no ônibus e sentiu o poder que tinha: ela inventava sua felicidade e decidia o destino.