O pé de Mamoeiro
O silêncio se abateu sobre o meu peito, o barulho que outrora me incomodava deu lugar a uma paz de espírito, o meu pé de mamoeiro contínua crescendo a olhos vistos (temo que o frio o derrube), o quarto está agora maior, mais vazio, mais quente. A chuva não pára de bater na minha janela, o livro deu agora lugar a um gadget de leitura, e, a tv se acende para tornar o espaço mais acolhedor e me fazer companhia nas noites frias de Outono.
E eu? – Sim, estou vivendo a segunda vida, sentindo o poder que corre nas minhas veias em direcção às minhas mãos loucas por escrever. Já não escrevo/leio no papel, hoje sou um amante das novas tecnologias, às vezes ainda dou por mim sentindo o cheiro das páginas de um velho livro que se encontra amontoado na minha prateleira ou riscando uma folha em branco que não passa disso mesmo. Mas caro leitor, isso é apenas passageiro, pois ler num Kindle e escrever num notebook é tudo de bom. Estou lendo mais e melhor do que nunca. Quanto ao escrever? É uma incógnita.
Esta semana ando lendo “Crime e castigo” de Fiodor, depois de ler os “Irmãos Karamazovi” e o “Idiota”, achei por bem continuar nesta Odisseia psicológica/existencialista de um dos maiores escritores de sempre, se não o maior. A cada livro dele que meto no bucho mais um sem número de possibilidades se acrescentam à minha cabeça. É tão enriquecedor ler algo que parece tão actual! Em Crime e Castigo o autor nos fala de um Jovem estudante de Direito que decide cometer um crime, mas para o qual não estava preparado, pois o castigo que recebeu da sua consciência é deveras pesado.
Há nesta primeira parte do livro algumas frases que me suscitam bastante interesse, principalmente esta: “a doença pode engendrar o crime, ou por outro lado, o crime pela sua própria natureza, é sempre acompanhado por um certo género de doença”. Esta frase explica quase na totalidade o que está na base de um crime, e como ele se pode processar, mesmo que a pessoa nunca tenha cometido tal ato. O ser humano, pela sua fraqueza, pode, de acordo com algumas circunstâncias chegar a esse ponto.
“Raskolnikov” se justifica dizendo que a morte de uma pessoa podia salvar mil vidas (incluindo a dele e dos restantes membros da sua família) num tempo em que a Rússia Csarista de Nicolau II era dominada pela corrupção e por malfeitores que se tornavam figuras de destaque. O simples leitor, pode achar estranho que Fiodor sempre fale de crimes nos seus livros, mas isso tem uma explicação bem simples, também ele perdeu seu pai vítima de um assassinato. Depois de perder sua mãe quando era muito jovem, viu seu pai ser assassinado por um servo da sua propriedade, e pelo que se soube na época, matou-o devido ao jeito austero como ele tratava seus servos, e olhem que a família de Fiodor não era rica, ao contrário da de Tolstoi.
Bem, comecei escrevendo sobre mamoeiros e acabei por falar em crimes da Rússia do século XIX. Mas nos meus escritos isso é quase uma fatalidade, quando começo nunca sei como vou acabar os meus textos. É o texto que me leva e não eu que levo o texto. Por isso, perdoem qualquer coisinha fora do contexto. Minha mente deambula de um lado para o outro sem pedir licença. Ela é uma criança inquieta.